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Acadêmico: José Renato Nalini Há tempos venho sustentando que não se fez ainda a profunda reforma estrutural na Justiça brasileira.
Receitas para o STF O constitucionalista Ives Gandra da Silva Martins, que atuou na fase pré-constituinte e escreveu, juntamente com Celso Bastos, quinze volumes de comentários à Constituição de 1988, fez instigante análise do STF em conferência na FIESP. A partir de publicação na FSP quanto ao fato de 63 dos brasileiros acreditarem que o Judiciário é ameaça à Democracia, comentou algumas decisões com as quais não concorda e que seriam indicativas de que o STF traz insegurança jurídica para o Brasil. Enfatizou a tese de que não foi a vontade constituinte quem tornou o Supremo um “superpoder”, que deixou a formatação dos “freios e contrapesos” para usurpar funções dos outros dois. Exatamente as duas funções estatais eleitas, legitimadas pelo sufrágio, o que não ocorre com o Judiciário. Onze magistrados que chegam ao ápice do sistema Justiça no Brasil, por vontade de um só eleitor: o Presidente da República. Há tempos venho sustentando que não se fez ainda a profunda reforma estrutural na Justiça brasileira, que efetivamente padece de falhas que a tornam disfuncional e aprofundam o descrédito que lhes devota o homem comum. Parece impossível qualquer alteração no esquema que deriva da letra do pacto federativo, pois as mudanças são traumáticas e, quando implicam em perda de competência, atingem os brios dos envolvidos, que lutam – renhidamente – pela preservação do status quo. Mas algo no plano ideal seria reduzir a competência do STF para a de Corte Constitucional, com perda das atribuições de quarta instância do sofisticado Judiciário tupiniquim e, pior ainda, de segunda instância dos Juizados Especiais. Essa mudança dependeria de emenda à Constituição e é ficção acreditar possa partir do Judiciário, que teria condições de convencer o Parlamento de que ela seria a melhor opção, pois a perda de precioso tempo em julgamentos não estritamente constitucionais é furtado à relevância da atribuição prioritária: a guarda precípua do pacto federativo. Outras providências relativamente singelas fariam com que o STF recobrasse o prestígio de que já fruiu em outras épocas, apesar da democracia frágil e sempre claudicante instaurada a partir do golpe republicano. Só que elas dependem de uma reforma cultural e esta é muito mais complicada do que a própria alteração do texto fundante. Por exemplo: o que é preciso para fazer os magistrados do STF entenderem que eles formam um colegiado e que decisões monocráticas devem ser evitadas? Como convencer magistrados de que prazos devem ser cumpridos e que o STF deveria servir como exemplo para toda a Magistratura brasileira? É no mínimo bizarro, para usar de eufemismo, que pedidos de “vista” em questões graves – e deveriam ser graves e sérias todas as pretensões que chegam ao STF – não sejam devolvidos na próxima sessão. Com o número de eruditos assessores a servir aos onze, todos eles recrutados na melhor Magistratura concursada do país, não há motivo para reter processos e paralisar a Justiça. É o que acontece quando temas de repercussão geral aguardam decisão, interrompendo o curso de milhares de processos em todos os demais tribunais e foros brasileiros. Algo bem simples também, seria dispensar o televisionamento das sessões da Suprema Corte. Ao argumento da transparência, o voto que deveria ser – em nome da eficiência, que também incide sobre a atuação da Magistratura – “concordo com o relator” ou “acompanho o relator”, tomam várias tardes e lentas horas de leitura transmitida para todo o país. O povo quer decisão, não erudição. Mais simples ainda, seria impedir viagens – principalmente ao Exterior, ainda que atribuídas a Seminários, Congressos, Cursos, na roda-viva ou moto contínuo do “turismo jurídico”, enquanto o juiz tivesse processo para julgar. Tenho a certeza de que tudo isso é impossível, pois seria considerado um atentado à honorabilidade do STF, um “golpe à Democracia”, cujo garante é o Judiciário, portanto qualquer mudança seria impensável. Só que, sem essas medidas tão simples e factíveis, nada mudará e tudo continuará como antes. Não é com a mudança do critério para escolha dos integrantes do STF que ele recuperará o prestígio e respeitabilidade hoje pelo menos comprometidos. O sistema atual ganharia musculatura ética se o Senado de fato “sabatinasse” o indicado e não fizesse uma sessão hagiográfica, verdadeira canonização do futuro magistrado que está acima de todos os demais. Nada autoriza previsão de outro cenário. O STF continuará a ser ofendido, injuriado, acerbamente criticado pelas redes sociais. Embora seus ministros sejam pessoas de elevado saber jurídico e de reputação ilibada. Só que escolheram comportamento funcional que não é a regra entre as Supremas Cortes dos países civilizados. Publicado no Blog do Fausto Macedo/Opinião/Estadão Em 26 04 2022 voltar |
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