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SE OUVÍSSEMOS NOSSOS SÁBIOS
Acadêmico: José Renato Nalini
José Bonifácio há 200 anos já se preocupava com a preservação da floresta

Se ouvíssemos nossos sábios

Nossa pressa em estar up to date nos faz perder a memória. Esquecemo-nos de que temos boas figuras, aquelas que não nos envergonham, porém dão legítimo orgulho.

Nestes tempos de destruição inclemente da natureza, penso em José Bonifácio que, há duzentos anos, já se preocupava com a preservação da floresta. Lamentava que Portugal tivesse permitido a eliminação do pau-brasil abundante na costa e mudasse o curso das coisas para gerar um nordeste seco.

Penso também em Hipólito da Costa, que precisa ser reverenciado em 2022, pois há duzentos anos deixava de circular o seu "Correio Brasiliense", jornal escrito em português mas editado em Londres, porque o Brasil contava com censura desde 1808, imposta com a criação da Imprensa Régia.

Hipólito da Costa entendia que a sede do Império brasileiro não devesse optar por apenas duas cidades: Lisboa ou Rio de Janeiro. Visionário, para ele nem Lisboa, nem Rio. O ideal de Hipólito era que a capital do mundo lusíada deveria ser transferida para o interior do Brasil, tese também defendida por José Bonifácio. Portugal, estreita faixa de terra espremida pelo Atlântico, não contava com interior. Já o Brasil o possuía em abundância. Tudo recomendava que a capital do Império fosse no interior brasileiro. Por motivos de ordem estratégica, inteiramente plausíveis à época, a Corte estaria a salvo e poderia cuidar com tranquilidade dos interesses imperiais quanto à segurança e bem-estar da população.

Hipólito escrevia em 1813: "O Rio de Janeiro não possui nenhuma das qualidades que se requerem na cidade que se destina a ser capital do Império do Brasil; e se os cortesãos que para ali foram de Lisboa tivessem assaz patriotismo e agradecimento pelo país que os acolheu, nos tempos de seus trabalhos fariam um generoso sacrifício das comodidades, e tal qual luxo, que podiam gozar no Rio de Janeiro, e se iriam estabelecer em um lugar do interior, central, e imediato às cabeceiras dos grandes rios, edificariam ali uma nova cidade, começariam por abrir estradas, que se dirigissem a todos os portos de mar, removeriam os obstáculos naturais que têm os diferentes rios navegáveis, e lançariam assim os fundamentos ao mais extenso, ligado, e bem definido e poderoso império, que é possível que exista na superfície do globo, no estado atual das nações que o povoam".

Como observa Therezinha de Castro, no livro "Hipólito da Costa: ideias e ideais", "nota-se nesse caso perfeita comunhão de ideias e ideais entre Hipólito da Costa e José Bonifácio. Desejava o estadista da independência a interiorização da capital, 'para pouco mais ou menos de 15 graus, em sítio sadio, ameno, fértil e regado por algum rio navegável'. Para o jornalista da independência, 'este ponto central se acha nas cabeceiras do famoso Rio de São Francisco. Em suas vizinhanças estão as vertentes de caudalosos rios, que se dirigem ao norte, ao sul, ao nordeste e ao sudeste, vastas campinas para criação de gado, pedra em abundância para toda sorte de edifícios, madeiras de construção para todo o necessário, e minas riquíssimas de toda qualidade de metais; em uma palavra, uma situação que se pode comparar com a descrição que temos do paraíso terreal".

Somente na década de 50 do século XX é que Juscelino construiu Brasília. Mas num cerrado já desprovido de árvores e com pouca água. Tudo por não sabermos ouvir os nossos sábios.


Publicado no Jornal de Jundiaí/Opinião
Em 14 04 2022



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