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Acadêmico: José Renato Nalini Para o historiador Oliveira Lima, Hipólito não era “um vil panfletário, mercenário”, mas “um temperamento bilioso, espírito irrequieto e fogoso, de uma inteligência ilustrada e perfeitamente convencida das suas preferências reformadoras”.
Hipólito, o empreendedor O verbete “empreendedorismo” é um dos mais utilizados em nossos dias. Como se fora descoberta recente e dele não se tivesse notícia antes do século 21. Não é verdade. Ao menos, não é verdade absoluta. O Brasil teve muitos empreendedores. A maior parte deles, anônimos. Entre os que se destacaram na História, podem ser citados Mauá e Hipólito José da Costa. Este nasceu em 25.3.1774, Hipólito José da Costa Pereira Furtado de Mendonça, na Colônia do Sacramento, enquanto ali prestava serviços às tropas portuguesa, seu pai, Félix da Costa Furtado de Mendonça, brasileiro de Saquarema. Viveu em terras gaúchas desde os três anos e estudou em Porto Alegre, até os dezenove anos, quando estava matriculado em Coimbra, onde se diplomou em Leis e Filosofia. Recebeu do Conde de Linhares a incumbência de viajar aos Estados Unidos, ali foi seduzido pela liberdade com que se debatiam as ideias e tornou-se autêntico liberal. Dentre seus interesses, aprendeu com os americanos como cultivar árvores, para preservar o clima favorável à agricultura. Escreveu “Memória da Viagem aos Estados Unidos” e também “Diário de Viagem a Filadélfia” e seis “Cadernos de Observações”. Queria voltar ao Brasil, mas acabou indo a Portugal e queria desenvolver uma Imprensa livre e crítica. Só que nessa época, pensar ou abraçar uma ideia significava tornar-se suspeito. O Santo Ofício levava à fogueira todos os que não estivessem afinados com a ideologia hegemônica, muitas vezes para satisfazer vinganças pessoais. Hipólito foi o primeiro brasileiro de que se tem notícia a ser vítima da Inquisição, sob acusação de ser simpático à maçonaria. Foi preso e de sua odisseia resultou o livro “Narrativa da Perseguição”. Mas o que interessa agora, é sua aventura na Inglaterra, como editor do “Correio Brasiliense”, que passou a publicar em português a partir de 1808 e que circulou até 1822, há exatos duzentos anos. O jornal foi proibido no Brasil, onde vigorava a censura oficial desde a criação da Imprensa Régia, coincidente com a abertura dos portos e chegada da família real, em fuga de uma Lisboa invadida por Napoleão Bonaparte. Como é frequente nas práticas do convívio, o que é proibido gera maior curiosidade e interesse. O Correio Brasiliense continuou a ser editado e prosperou, contando sempre com número crescente de assinantes, pois, repositório de críticas e sugestões, passaria também a ter muito maior sabor por ser proibida a sua leitura. Como diz Therezinha de Castro, em seu livro “Hipólito da Costa: ideias e ideais”, “no caso, inverteram-se os papeis: a censura daria ao Correio Brasiliense muito maior prestígio do que a própria liberdade de imprensa”. Seu empreendimento prosperou. Em 1818, Hipólito da Costa já se apresenta como possuidor de bens no Banco da Escócia, como personagem ligado à alta sociedade inglesa, frequentador assíduo da Corte da Inglaterra. Outro dado indicativo de sua prosperidade econômica, é o fato de seu jornal, que fora impresso na Oficina W. Lewis, no número 2 da Paternoster Row, passar a contar com oficina própria a partir de 1811. A assinatura custava dois guinéus, com circulação mensal. No último ano de circulação, em 1822, era bem cara a assinatura, que precisava ser feita junto a um negociante estabelecido no Rio de Janeiro, J.J.Dodsworth, ao preço de 1.280 réis, além do porte que custava 110 réis. O “Correio Brasiliense” dispunha de parte dedicada à Correspondência e Reflexões sobre as novidades do mês, mais as seções Política e Artes, Literatura e Ciências e Miscelâneas. Intitulava-se “jornal editado para o mundo lusíada” e tinha como divisa um verso de Camões: “Na quarta parte nova os campos ara/E se mais mundo houvera, lá chegara”. No “Aviso aos Portugueses sobre o Correio Brasiliense”, opúsculo publicado na Impressão Régia em 1811, alertava-se: “Este periódico advoga a causa do Inimigo Comum e maldiz a nossa; o pretexto é o bem da Pátria, o fim é inspirar o ódio à Constituição, ao Soberano e ao Governo, deve portanto tirar-se a máscara a esta Víbora, e sufocar-se.” Não era fácil manter independência sob um governo despótico e inimigo da livre discussão. Para o historiador Oliveira Lima, Hipólito não era “um vil panfletário, mercenário”, mas “um temperamento bilioso, espírito irrequieto e fogoso, de uma inteligência ilustrada e perfeitamente convencida das suas preferências reformadoras”. Tudo continua igual no reino do espírito humano. É mais fácil colher os frutos da submissão, da proximidade com o poder, do que pretender reformá-lo, reconduzindo-o à função instrumental de bem servir ao povo e de fazer mais feliz o maior número de pessoas que se possa. Publicado no Blog do Fausto Macedo/Opinião/Estadão Em 16 04 2022 voltar |
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