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Acadêmico: José Renato Nalini Empresariado assumiu protagonismo porque o Estado não tem respostas
O território do dissenso Não é fácil desvendar o Brasil. Ele é um poliedro mutante. Suas inúmeras faces mudam constantemente de tonalidade. É uma nação camaleônica. Ontem, crucificava-se um líder. Hoje ele é endeusado. As opiniões mudam ao sabor dos algoritmos. O único aparente consenso é a mais absoluta falta de consenso. Quando a Democracia Representativa entra em pane, como é o caso brasileiro, e a Democracia Participativa não encontra espaço nas estruturas herméticas dos "donos" da política partidária, é preciso recorrer a outras estratégias. A ficção da "sociedade civil" é uma delas. O Terceiro Setor também. Por sinal, a Constituição da República Federativa do Brasil de 5.10.1988, foi a que mais incentivou a formação de entidades gregárias. Basta verificar os incisos do artigo 5º que falam sobre a liberdade de associação e seu funcionamento, um verdadeiro convite ao gregarismo. Embora ainda tutelada por um Estado onipotente, a sociedade consegue se organizar em alguns nichos de consciência cidadã. Ainda existe lucidez no Brasil. Ela ainda não atravessa a blindagem interesseira dos políticos profissionais, mais empenhados em questões egoísticas, assim como o orçamento secreto, aumentar os Fundos Eleitoral e Partidário, organizar eleições e reeleições, para garantir a perpetuidade no comando da estrutura estatal. Todavia, se houver uma conjunção de esforços, algo urgente no atual momento brasileiro, questões complexas poderão ser ao menos encaminhadas. Chame-se também a Universidade, sensibilize-se a mídia, tanto a espontânea, como a produzida pelas redes, para que auxiliem o enfrentamento dos temas polêmicos. Aqueles que não logram a utopia da unanimidade. O empresariado assumiu protagonismo singular, exatamente porque o Estado não tem respostas para os desafios contemporâneos. Roberto Waack chama de "problemas indomáveis", aqueles postos na relação das empresas com a sociedade. São aqueles problemas para os quais as companhias não conseguem obter respostas confiáveis, os que elas não têm condições de gerenciar, medir ou sequer formular com clareza e objetividade. O maior perigo a ser enfrentado pela humanidade é o aquecimento global. Ele resulta de maus tratos infligidos pelo homem à natureza. O desmatamento é uma das principais fontes da emissão de gases venenosos, causadores do efeito-estufa. E parte considerável deriva da pecuária. Por isso o embate entre os que não renunciam ao consumo de carne bovina e os que a abominam. Há gradações nesse quadro. Entre estes, os que acreditam que a carne está contaminada por antibióticos, os que aderem ao vegetarianismo ou ao veganismo, por acreditar que carne vermelha faz mal à saúde. Os que se recusam a consumir carne provinda de pecuária explorada em áreas desmatadas. Também aqueles que alegam motivos filosóficos e os que consideram absurdo matar um bezerrinho. Não há possibilidade de acordo entre essas tendências. As empresas que vivem da pecuária procuram respostas. Aduzem que a ciência conseguirá reduzir os efeitos da emissão de metano gerada pelo gado, seja pela digestão, seja pela flatulência. Procuram atingir os mais sensíveis, argumentando que existe a fórmula de um "boi feliz" e de um abate sem sofrimento. Uma democracia seria, em tese, o convívio entre as diferenças. Respeitar quem pensa de maneira diversa. Tentar persuadir, procurando obter, senão consensos, algum consentimento. A mentalidade ESG propõe o trato simultâneo dos aspectos ambientais, sociais e corporativos. É uma boa agenda. De difícil observância. Por exemplo: os produtores de carne dependem de centenas de pequenos proprietários e criadores, muitos deles desmatadores. Se forem sumariamente eliminados, continuarão na clandestinidade. O trabalho de formiguinha é conscientizá-los e ajudá-los a assumir uma postura ecológica. Que o castigo da pandemia e o flagelo da guerra na Ucrânia - guerra, sim, não mera operação - conduzam a humanidade a procurar o equilíbrio de um convívio polido e educado. Como devem ser as relações civilizadas. E exigir esse mínimo dos que se dedicam à política, hoje um campo minado envolto em corrupção e hipocrisia. Publicado no Jornal de Jundiaí/Opinião Em 17 03 2022 voltar |
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