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Acadêmico: José Renato Nalini Políticos apostam que tragédias vão acontecer nas próximas gestões
Universidade versus Política A Universidade é o local em que a busca da verdade é o compromisso que justifica a sua existência. Isenta de interesses outros que não a disseminação do conhecimento, da pesquisa e da extensão, tem a obrigação de transformar - para melhor - o mundo e a convivência. Neste momento histórico em que o aquecimento global é o maior desafio, pois afeta o planeta inteiro e aflige principalmente os mais carentes, a Universidade cresce em importância. É dela que devem vir as receitas para mitigar as catástrofes e para evitar o caos total. Isso interessa de perto ao Brasil, que vê recrudescer ocorrências trágicas em virtude de uma conjunção de fatores. O desmatamento acelera o desequilíbrio climático. Oscila entre chuvas torrenciais e secas inclementes. Repete-se a crônica da tragédia em Petrópolis, mas também em Franco da Rocha, Francisco Morato, Caieiras, sem falar nos episódios registrados na Bahia, Minas Gerais e Goiás. Não há cidade imune às consequências do desastre ambiental. E não é por falta de aviso. A Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil, em 2021, adverte que os impactos são maiores nas cidades, em virtude das interações entre os extremos climáticos com a infraestrutura associada à crescente população urbana, bem como com as atividades econômicas. O arquiteto Kazuo Nakano, do Instituto da Cidade da Unifesp, diz que nossas cidades são verdadeiras bombas socioecológicas urbanas explodindo nas periferias. E isso porque as prefeituras negligenciam em seus deveres. Muitos municípios já possuem mapeamento de risco de áreas urbanas, em níveis alto e moderado. A Universidade dispõe de instrumentos para fazer sondagem do solo mas, para isso, precisa contar com a Prefeitura. Ações concretas e investimentos são imprescindíveis e nem sempre levados a sério pelos políticos. A experiência do professor Antonio Guerra, do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, é muito direta: "Qual governo quer ter o desgaste político de remover pessoas, derrubar casas e construir em outras áreas?". Para ele, os políticos apostam na chance de que as tragédias aconteçam nas próximas gestões. Eles sequer divulgam os mapas de risco à população, sob o argumento de não criar pânico. Incrível que as prefeituras recebem os levantamentos e estudos praticamente de graça, mas não se movem. A Universidade está cumprindo com sua missão, mas os políticos não. Espelham-se no exemplo federal que tem o descaramento de afirmar que a Amazônia permanece incólume, assim como estava em 1500, quando houve a chegada portuguesa e que se compromete com o desmatamento em 2050. Será milagre se os que prometeram estiverem vivos nessa data. Todo prefeito consciente deveria impedir que os topos dos morros e as margens dos rios fossem ocupados. Os que vão para esses espaços o fazem porque não têm dinheiro para morar em lugar mais adequado. Não é impossível vincular a construção de mais um edifício à construção de um pequeno grupo de moradias populares. A par disso, combate-se o aquecimento global e mitiga-se a catástrofe climática mediante uma política ambiental consequente. As cidades têm de ser espaços mais permeáveis. Boa parte do problema está na eliminação das áreas verdes, substituídas por asfalto. A civilização do automóvel, o vilão poluidor que ainda funciona mediante uso de combustíveis fósseis venenosos. Emissores dos gases causadores do efeito-estufa. Rios assoreados, córregos encanados para serem cobertos por novas pistas automobilísticas. Quando surgirá o alcaide com coragem para devolver áreas invadidas ao verde, não tenha medo de ressuscitar rios enterrados? Muitos políticos brasileiros visitam Seul e voltam entusiasmados. Mas não assumem a responsabilidade de descanalizar seus cursos d'água como os coreanos fizeram. Além de enfeitar a paisagem, esse rio urbano integra uma estratégia para ampliar a capacidade de vazão durante enchentes. Aqui, lamenta-se a ocorrência das tragédias. Apela-se à solidariedade cidadã. Mas aquilo que a Universidade oferece não é levado em consideração. Tudo continuará assim, só que muito pior. Tomara que não! Publicado no Jornal de Jundiaí/Opinião Em 13 03 2022 voltar |
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