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Acadêmico: José Renato Nalini Enquanto o Brasil assiste inerte à destruição da Amazônia e dos demais biomas, a Escócia cuida de repovoar suas terras com árvores e crianças
Civilização é outra história Enquanto o Brasil assiste inerte à destruição da Amazônia e dos demais biomas, a Escócia cuida de repovoar suas terras com árvores e crianças. Ali se desenvolve um interessante projeto de reflorestamento com árvores nativas, que se denomina “floresta comunitária”. A Escócia é um país em que 0,25 da população detém quase 70 do território. No século XVIII houve a expulsão em massa de escoceses, quase todos agricultores, que migraram para a Austrália e Estados Unidos. Houve esvaziamento das cidades e as áreas rurais foram destinadas à criação de ovelhas. Com isso, desapareceu a cobertura nativa e flora e fauna empobreceram. Um governo consciente do perigo do aquecimento global ajuda, editando legislação que favorece a aquisição de áreas por comunidades de moradores que se comprometem a reflorestar, agora valendo-se das espécies que originalmente cobriam o país dos kilts e das gaitas de fole. A ideia que inspirou os primeiros cultores dessas novas florestas foi criar uma “ecovila intencional”. Uma ecovila conta com escola, mercado, pub, correio e atrairia – como efetivamente atraiu – jovens casais dispostos a uma vida mais saudável, junto à natureza. Esse milagre da recomposição do ambiente genuíno, conspurcado pela ignorância e pela cupidez, é perfeitamente possível em qualquer parcela do planeta. Aos poucos as comunidades vão se convencendo de que essa é a alternativa ao completo exaurimento dos recursos naturais e se conscientizam de que é possível ampliar as áreas, adquirindo-as a particulares e mesmo ao Poder Público. Existe, na Escócia, uma agência governamental que ajuda a implantar o projeto de silvicultura, garante renda da madeira, inclui o refazimento da flora original, tudo para a recuperação plena da biodiversidade vegetal e animal, desperdiçada em outra época. Tudo se faz simultaneamente a uma educação ambiental para as crianças, com o intuito de fazê-las compreender que depende dos humanos a preservação da vida na Terra. E que a vida pode ser agradável, rentável e feliz, desde que a natureza seja respeitada. Não há incompatibilidade entre a preservação e o progresso material. Apenas inteligência, algo que parece faltar no quarto mundo. Propicia-se também a jovens de todos os países, oportunidade de intercâmbio de verão, experiência remunerada, para que jovens entre 16 e 18 anos aprendam botânica, marcenaria, engenharia civil prática, desenho de caminhos, avaliação de riscos e saúde, primeiros socorros e noções de segurança. Uma nova mentalidade nasce num ambiente auspicioso, a Escócia. Quanta diferença no cotejo com países que exterminam o seu futuro e parecem não se dar conta disso. Existe uma Aliança Global de Comunidades Territoriais, cujo espírito luminoso bem poderia chegar ao Brasil. Principalmente agora, quando se apura que 2021 foi o sexto ano mais quente já registrado, de acordo com agências norte-americanas. Evidência de que o aquecimento global é uma realidade e não uma ficção ecoterrorista como os céticos gostam de ironizar. O ceticismo continua a causar enorme prejuízo à salvação da Terra, pois ele é bem remunerado. Os pseudocientistas que elaboram estudos para tranquilizar a sociedade querem fazer crer que a Terra encontrará fórmulas de superar o malefício causado pela raça humana. Mesmo diante de episódios como os que ocorreram estas semanas em Minas Gerais e na Bahia, a ideologia da negação continua ativa. É o que o jornalista Marcelo Coelho mostrou na reportagem “Tsunami de dados sobre clima mal consegue varrer propaganda” (FSP, 14.1.22). É absurdo, seria surreal não fosse a atual condição do Brasil negacionista, que grandes fazendeiros paguem “para assistir a palestras de um professor aposentado de meteorologia que nega os dados de satélites e computadores da Nasa. Seus argumentos fazem tanto sucesso quanto bandeiras do Brasil, na porteira das propriedades, e atentados de saúde pública do presidente e de seu séquito de charlatães na medicina”. A pseudociência faz tudo por dinheiro. Assina teses para sustentar que a fauna do canavial é superior à da Mata Atlântica. Para Marcelo Coelho, “talvez alguns dos sojicultores que estão perdendo sua safra na seca a assolar o sul do país mudem de ideia, assim como alguns militantes antivacina podem se render diante da morte por Covid de um membro da família. Talvez. Se e quando mudarem de ideia, entretanto, poderá ser inócuo. Contra o coronavírus há máscaras, distanciamento, vacinas e a possibilidade de adaptá-las para combater novas cepas, mas com a crise climática são outros 500”. Advertências dos cientistas, a voz isolada de alguns ambientalistas, tudo tem sido insuficiente diante da má-fé, de braços dados com a ignorância. Já a civilização é outra história. Chegará um dia até nós? Publicado no Blog do Fausto Macedo/Opinião/Estadão Em 29 01 2022 voltar |
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