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Acadêmico: José Renato Nalini O artista genial e polivalente que é Júlio Medaglia oferece à sua legião de admiradores mais um livro: “Atrás da pauta – Histórias da Música”. São nada menos do que 178 textos dos 300 publicados na Revista “Concerto”, desde 1996.
Atrás da pauta O artista genial e polivalente que é Júlio Medaglia oferece à sua legião de admiradores mais um livro: “Atrás da pauta – Histórias da Música”. São nada menos do que 178 textos dos 300 publicados na Revista “Concerto”, desde 1996. Na verdade, é uma enciclopédia sobre esse milagre chamado música. Ele agrupou as crônicas em textos de intervenção, música e outras artes, música e mídia, compositores brasileiros, compositores estrangeiros, maestros, as intérpretes, os intérpretes, músicos estrangeiros no Brasil, MPB, rock, jazz, outros registros populares e música erudita, ensino e pesquisa musical e o último capítulo é pitorescamente denominado etc. Assim que tive o precioso exemplar em minhas mãos, comecei a devorá-lo. E ele se mostrou intensamente saboroso. Comprovo a devoção fervorosa de Júlio Medaglia pela música, a vontade de propagá-la para que inflame todos os brasileiros, notadamente os que estão na infância e juventude, o verdadeiro heroísmo desempenhado na formação de novos talentos. Constatei, com satisfação imensa, que Júlio leva a sério a sua condição de imortal, integrante da Academia Paulista de Letras. Ele cultiva seus companheiros acadêmicos, desde a apresentação, quando menciona seu patrono, Mário de Andrade. Que vai ser tema de um texto sobre a valorização da cultura espontânea e também merecerá o cognome de investigador apaixonado da alma brasileira. Logo nas primeiras páginas, cita Ignácio de Loyola Brandão, o bi-acadêmico, que também integra a Casa-Mãe, a Academia Brasileira de Letras. Homenageia João Carlos Martins, “o indestrutível”, o pranteado Zuza Homem de Mello, “o ouvido clínico da MPB” e não deixa de lado o inesquecível Paulo Bomfim, o Príncipe dos Poetas Brasileiros e durante tantos anos decano da Academia Paulista, ao escrever que Magdalena Lébeis capta o sentido secreto das coisas. Sem falar que Leandro Karnal prefaciou o livro. Todas as crônicas são gostosas de ler. Trazem conhecimento consolidado nas décadas que Júlio atuou na regência, na composição, no ensino da música e na sua batalha para dotar todos os municípios brasileiros de sua orquestra. Embora erudito, com aprimoramento lapidado no Velho Mundo, prestigia amorosamente a música brasileira. Compara os nativos que compunham no século XVIII, principalmente nas Minas, com os grandes e consagrados nomes europeus. Revi, na memória de adolescente, as grandes damas que ele relaciona como intérpretes, as quais privilegiadamente ouvi, seja na Fazenda Campo Verde, seja no pavilhão de música mantido à rua Turquia pelos mecenas Dulce e Victor Geraldo Simonsen. Que magia fascinante a música: pude voltar cinco décadas e ouvir de novo Guiomar Novaes, Magda Tagliaferro, Yara Bernette e a voz maviosa de Anna Maria Kieffer. Só faltou Anna Stella Schic. É impossível destacar apenas um dentre tantos textos sedutores. Agrada-me, contudo, abordar o Júlio Medaglia ecológico. O fomentador de novas carreiras na Fundação Padre Anchieta, o responsável pelo imperdível programa das dezessete horas na Rádio Cultura, só poderia ser um homem sensível, apreciador da complexa e exuberante natureza. Diz ele: “Ver revoadas de pássaros que se movimentam rapidamente nos céus, mudando de rumo bruscamente sem que haja o menor atropelo ou trombadas – como verdadeiras nuvens inquietas. Ou cardumes com milhares de peixes nadando no mesmo sentido, como se guiados por um supermaestro submerso e invisível. É. Parece que o instinto de coletividade, gregário, é algo comum no reino animal, incluindo-se aí o animal racional que domina o planeta, dotado de especial inteligência: o homem”. Prossegue a incursionar pela natureza histórica dos humanos, sua inteligência, focando o paradoxo de a espécie racional ser também a mais bárbara. “Não há um momento nesses seis mil anos de história registrada que não se tenha notícias de algum conflito entre seres humanos, comunidades ou nações”. Narra sua emoção ao reger pela primeira vez a Filarmônica do Amazonas, que ele concebeu e formou. E se encanta com a internet: “Sim, a mesma e impessoal internet que serve para pagar contas ao simples toque de botões, para encomendar uma pizza ou para resolver rapidamente um problema de informação através do Google, agora está sendo usada para unir pessoas através da mais sublime característica da alma: a emoção humana. Quando alguém – como se tem visto ultimamente – grava ao piano uma versão de sinfonia de Beethoven e a envia para dezenas de músicos do planeta e estes, associando-se a essa provocação sonora e emotiva, pegam seus instrumentos e preenchem aquele modelo com sonoridades orquestrais, estão se comunicando não apenas através dos mecanismos estruturais e matemáticos da partitura e da eletrônica, mas se unindo e dando vida à criatividade daquele músico que a criou e à daquele que a executou e a enviou mundo afora”. Tem razão o Maestro Júlio Medaglia: “não seria o caso de colocarmos um maestro na presidência da ONU?”. Mas também seria o caso de termos Maestros para reger a política brasileira, tão desafinada hoje em dia. Publicado no Blog do Fausto Macedo/Opinião/Estadão Em 26 12 2021 voltar |
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