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Acadêmico: José Renato Nalini Os animais de sangue frio são os únicos que têm veneno
Aforismos instigantes Aforismos são máximas, ditados sintéticos de ideias geralmente destinados a gerar reflexão ou até mudança comportamental. Há infinitos aforismos e também é enorme a quantidade de pensadores que se propuseram a formulá-los, alguns dos quais persistem por serem clássicos na literatura universal. Revejo uma coleção de aforismos de Arthur Shopenhauer (1788-1860), que são atuais e provocativos. Alguns deles merecem uma reflexão. Por sinal, cheguei a aplicar provas aos alunos de Filosofia, no Bacharelado em Direito, pedindo que dissertassem a respeito de um aforismo. Interessante obter o caleidoscópio das impressões causadas nas mentes juvenis, com distintas origens, concepções ideológicas, filosóficas ou confessionais. Mas vamos a Shopenhauer: ariqueza influencia-nos como a água do mar. Quanto mais bebemos, mais sede temos. O mesmo vale para a glória. A música exprime a mais alta filosofia numa linguagem que a razão não compreende. Se na hora de uma necessidade os amigos são poucos? Ao contrário! Basta fazer uma amizade com alguém para que logo que este se encontre numa dificuldade, peça dinheiro emprestado. Observem que o caráter de quase todos os homens parece particularmente adaptado a uma certa idade da vida, de modo que nela se apresenta da forma mais proveitosa. Alguns são jovens amáveis, e depois isso passa, outros, homens enérgicos e ativos, dos quais a idade rouba todos os valores. Muitos apresentam-se mais favoravelmente na velhice, quando são mais indulgentes por serem mais experientes e serenos. A serenidade e a vitalidade da nossa juventude baseiam-se em parte no fato de que nós, ao subirmos a montanha, não vermos a morte, pois ela encontra se do outro lado da encosta. Vista pelos jovens, a vida é um futuro infinitamente longo; vista pelos velhos, um passado muito breve. A glória deve ser conquistada; a honra, por sua vez basta que não seja perdida. A solidão é o destino de todos os espíritos eminentes.O que torna as pessoas sociáveis é a sua incapacidade de suportar a solidão e, nela, a si mesmos. O dinheiro é uma felicidade humana abstrata; por isso aquele que já não é capaz de apreciar a verdadeira felicidade humana, dedica-se completamente a ele. O dinheiro é a coisa mais importante do mundo. Representa: saúde, força, honra, generosidade e beleza, do mesmo modo que a falta dele representa: doença, fraqueza, desgraça, maldade e fealdade. Casar-se significa duplicar as suas obrigações e reduzir à metade os seus direitos. Nas pessoas de capacidade limitada, a modéstia não passa de mera honestidade, mas em quem possui grande talento, é hipocrisia. Mostrar cólera e ódio nas palavras ou no semblante é inútil, perigoso, imprudente, ridículo e comum. Não devemos mostrar a nossa cólera ou o nosso ódio senão por meio de atos; e estes podem ser praticados tanto mais perfeitamente quanto mais perfeitamente tivermos evitado os primeiros. Os animais de sangue frio são os únicos que têm veneno. Quem não tem medo da vida também não tem medo da morte. Os eruditos são aqueles que leram nos livros; mas os pensadores, os gênios, os iluminadores do mundo e os promotores do gênero humano são aqueles que leram diretamente no livro do mundo. Quanto mais elevado é o espírito, mais ele sofre. As religiões, assim como as luzes, necessitam de escuridão para brilhar. A nossa felicidade depende mais do que temos as nossas cabeças, do que nos nossos bolsos. A honra é, objetivamente, a opinião dos outros acerca do nosso valor, e, subjetivamente, o nosso medo dessa opinião. A ignorância só degrada o homem quando se encontra em companhia da riqueza. Entre os desejos e as realizações destes, transcorre toda a vida humana. A memória age como a lente convergente na câmara escura: reduz todas as dimensões e produz, dessa forma, uma imagem bem mais bela do que o original. Raramente pensamos no que temos, mas sempre no que nos falta. Renunciamos a muito de nós mesmos para sermos como os outros. Há muita sapiência nessas lições de Shopenhauer. Dois séculos nos separam e o ser humano continua a ser esta entidade complexa, angustiada e carente, que necessita a cada dia, de um apoio externo para o enfrentamento das vicissitudes do existir. Publicado no Jornal de Jundiaí/Opinião Em 19 12 2021 voltar |
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