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Acadêmico: José Renato Nalini Há imenso capital social no Brasil, com bons exemplos que não merecem atenção da mídia espontânea, mais afeiçoada a gossips, a narrativas e versões, e menos interessada em assumir sua inequívoca função formativa.
Milionários em capital social Num período em que o Estado falha e mostra suas chagas, a sociedade tem não só o dever, mas a oportunidade de protagonizar sua missão de assumir as rédeas da convivência. Para isso, o conceito de capital social é uma poderosa alavanca. Por “capital social” se entende o conjunto de recursos e capacidades disponíveis em indivíduos e grupos de pessoas para o desenvolvimento social e político. A representação política é um sistema de fragilidade extrema. Quem é que, no Brasil de 2021/2022, se sente condignamente representado? Por isso é que a sociedade civil tem de assumir o encargo de educar a cidadania, suprindo aquilo que os desfibrados Partidos Políticos não fazem: eles recebem polpudas verbas dos Fundos Partidários e Eleitorais, cuja destinação deveria ser um projeto consistente de educação política cidadã. Uma Democracia não se satisfaz com esquemas formais, ainda que de índole fundante, mas se aperfeiçoa com um sólido quadro de atitudes e comportamentos da comunidade política de pessoas. A seiva democrática vai nutrir uma sociedade vigorosa, diversificada, plural e com crescente intensidade de participação na gestão dos interesses comuns. A cidadania ativa pressupõe distintas formas de organização e redes humanas, todas com efetiva e ampla participação no debate de assuntos de interesse comum. Pensadores do mundo civilizado já exploraram a participação como fator-chave para o sadio desempenho do regime democrático. Todos os diagnósticos recentes sobre uma democracia em crise indicam elevado grau de consenso a respeito da correlação entre a qualidade de participação e o funcionamento hígido do sistema político. Basta examinar o que já se escreveu sobre Democracia Participativa, Democracia expansiva, Democracia sólida, Democracia associativa e democracia cosmopolita. A participação cidadã é o mais eficiente contrapeso às tendências autoritárias que países periféricos ostentam nestes últimos anos. Para o Brasil, o que se assiste – é lastimável – é o desmonte das estruturas participativas edificadas durante décadas de conquistas legítimas, bastando a menção do mais emblemático dos exemplos: a tutela ambiental. Nada obstante a tentativa de sufocar os reclamos populares, há um clamor insistente sobre a intensificação das fórmulas participativas. Não se fale da participação formal das eleições, mas da atuação rotineira e cotidiana de se contribuir com a consecução do bem comum. Tarefa prioritária é consolidar as respostas prontas e eficientes de atendimento aos desvalidos durante a pandemia. Por que não tornar tudo isso uma prática permanente? A democracia real precisa dispor de procedimentos de participação na fase da discussão, dos debates, de administração de conflitos e multiplicar as estratégias de obtenção de consenso. Não se deve esperar que o legislador normatize todas as hipóteses, pois ele é incapaz de prever aquilo que a exuberante complexidade social fará surgir, pois o inesperado sempre nos surpreende. Mas grupos sociais, associações, de variegada dimensão e pessoas físicas devem participar ativamente no regime democrático e em suas instituições. O ideal é alcançar uma Democracia Deliberativa, que consiste, em síntese, na democratização da democracia. Algo inteiramente contrário ao que se tenta preservar em fases de obscurantismo: uma democracia delegativa. O cidadão se resigna a delegar ao representante a responsabilidade de governar como lhe pareça conveniente, sem a contínua prestação de contas ao cidadão delegante. Algo que os anglo-saxões tentam minimizar, mediante implementação do instituto do “recall”. Possibilidade de cassar o representante em pleno curso do mandato, se vier a trair os interesses dos representados. A fórmula tradicional – e a mais eficiente – para se caminhar rumo a esse ideal é a educação, única chave de transformação da sociedade. Educação é o instrumento, por excelência, para que a humanidade avance na direção dos ideais de harmonia, liberdade e justiça social. O Brasil precisa de uma educação de qualidade, algo de que o governo parece olvidar-se. Mas também de uma educação cidadã, baseada em princípios de solidariedade, de cooperação e de cultivo e vivência de valores democráticos. Uma educação cidadã treina o indivíduo para fiscalizar de perto a atuação do Estado, ente cujos tentáculos oprimem o indivíduo, sobrecarregado de cargas tributárias e burocráticas. Algo que as redes sociais podem acelerar, desde que deixem de ser usinas de fomentação do ódio e da intolerância e se prestem a transformar – para melhor – uma sociedade abandonada à sua própria sorte. Há imenso capital social no Brasil, com bons exemplos que não merecem atenção da mídia espontânea, mais afeiçoada a gossips, a narrativas e versões, e menos interessada em assumir sua inequívoca função formativa. A messe é grande e não há obreiros suficientes. Mas é isso o que estes tempos plúmbeos nos reservam. Publicado no Blog do Fausto Macedo/Opinião/Estadão Em 13 12 2021 voltar |
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