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Acadêmico: José Renato Nalini A profusão de teorias, doutrinas, teses, dissertações e ensaios não elimina a barreira entre o ambiente do direito e o seu usuário. Por que a cidadania continua a desconhecer os meandros labirínticos do sistema Justiça?
Qual a causa para a dificuldade comunicacional da área jurídica? A profusão de teorias, doutrinas, teses, dissertações e ensaios não elimina a barreira entre o ambiente do direito e o seu usuário. Por que a cidadania continua a desconhecer os meandros labirínticos do sistema Justiça? Pode haver uma conjugação de circunstâncias, todas convergindo para a débil comunicação estabelecida entre oferta e demanda do justo concreto. O universo jurídico se caracteriza por um uso arrevesado da linguagem. O bacharelismo notabilizou-se por uma retórica insuscetível de atingir o leigo. Em nome de um tecnicismo capaz de atestar que as ciências sociais têm estrutura idêntica à das “ciências duras”, exagerou-se na arte de multiplicação dos verbetes, sem evidência de vantagens para a compreensão. Escrever “difícil”, complicar em vez de facilitar, abusar da prolixidade, passaram a residir nas praxes forenses. Esse hábito entranhou-se de maneira tal na cultura do direito, que têm sido frustrados os movimentos tendentes a simplificar o “juridiquês” e a reclamar objetividade nos textos doutrinários e jurisprudenciais. A ciência do direito deveria ser imediatamente assimilada por seus destinatários, ou seja, por todas as pessoas capazes de discernimento. Direito é ferramenta para facilitar a vida humana, em lugar de torná-la ainda mais aflitiva, o que não é raro ocorrer. O rebuscamento da linguagem sufoca e sepulta qualquer possibilidade de uma comunicação eficiente. O grande Orlando Gomes já afirmava que o ensino do direito tem sido uma navegação de cabotagem ao longo dos códigos. Não se inova em estilo, mas se preserva a estrutura legada pelos Romanos. Sólida, por sinal. Porém de difícil apreensão por parte dos principais interessados: os que dependem da Justiça para a defesa de seus direitos. Mais relevante ainda, quando esta era registra uma escandalosa litigiosidade, que obriga a quase todo brasileiro a entender um pouco de direito e muito do funcionamento da máquina chamada Justiça. O fenômeno da judicialização é algo que também se encontra em outros países, mas não com a intensidade como o registram as últimas décadas brasileiras. Os estrangeiros estranham a dimensão das demandas que chegam aos Tribunais. Chegam a caçoar, nos círculos herméticos dos seminários jurídicos, dizendo que os brasileiros trocaram o hobby do futebol pela litigância. Explica-se em parte esse quadro. O Brasil possui hoje mais Faculdades de Direito do que a soma de todas as outras existentes no restante do planeta. Isso fez proliferar o número dos profissionais das carreiras jurídicas e o crescimento vegetativo das estruturas judiciárias. Como se existisse uma rígida fronteira entre direito e comunicação, é frágil a desenvoltura dos escritórios de advocacia com a clientela que nem sempre consegue saber o que ocorre com os seus processos. Qual a explicação para essa impressionante metamorfose? Uma questão concreta, real, pulsante de vida, converte-se em tese tão hermética e rebuscada, que o personagem principal, o sedento por justiça, nela já não mais se reconhece. O surrado diagnóstico “o seu problema é falta de comunicação”, tem sido sumariamente ignorado pelos profissionais do direito. O advogado exerce uma atividade essencial à administração da Justiça. Foi o único profissional que ganhou tão explícita dimensão na Constituição da República: artigo 133 do pacto fundante. Ora, “o exercício do poder de forma democrática baseia-se em uma comunicação eficiente, no diálogo com os agentes sociais, econômicos e políticos. Comunicar-se com base em planejamento e coerência é ação fundamental”[1]. Há plataformas estratégicas que viabilizam a comunicação e a imersão do planeta nas tecnologias da Quarta Revolução Industrial obrigam se acelere a reflexão em torno à adoção de diretrizes comunicacionais muito claras. As mídias sociais, tidas como grandes vilãs, permitem ligação direta com a população e têm o seu lado positivo. Estamos imersos nessa realidade. Houve nítida mudança de paradigma e não foram poucos os que se refugiaram numa zona de conforto, como se essa profunda mutação estrutural da vida em sociedade não merecesse alteração de rumos. A comunicação na advocacia passou a constituir uma cultura organizacional a ser levada a sério. É fundamental desenvolver uma visão integrada e sistêmica do diálogo que a advocacia tem de manter e aprimorar, num estágio civilizatório em que as pessoas aprenderam a reivindicar e não se satisfazem com a superada fórmula do saber monopolizado pelos presumíveis detentores exclusivos do conhecimento. Na brilhante passagem de Leonardo da Vinci: “A simplicidade é o mais alto grau de sofisticação.” Publicado no Blog do Fausto Macedo/Opinião/Estadão Em 02.10.2021, em coautoria com Bruno Pedro Bom* *Advogado e publicitário, fundador da BBDE Marketing Jurídico, diretor de Marketing do IBDP. Autor da obra Marketing Jurídico na Prática, publicado pela editora Revista dos Tribunais voltar |
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