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Acadêmico: José Renato Nalini Há décadas clamo no deserto a pleitear nova sistemática de concurso para ingresso nas carreiras jurídicas, mormente na Magistratura, onde estive por quarenta anos.
Um passo adiante. Mas ainda é pouco Há décadas clamo no deserto a pleitear nova sistemática de concurso para ingresso nas carreiras jurídicas, mormente na Magistratura, onde estive por quarenta anos. Enquanto o mundo se transformou, com uma disruptiva evolução propiciada pelas tecnologias incrementadas pelo fenômeno que se convencionou chamar “Quarta Revolução Industrial”, o recrutamento dos profissionais encarregados das mais sensíveis funções estatais continuam a ser selecionados à base da capacidade mnemônica. O empresariado já se convenceu de que esse método é ineficiente. Hoje recorre a “head-hunters” e a grupos especializados em seleção de pessoal. Já o aspirante à Magistratura, ao Ministério Público, à Defensoria Pública, às Polícias, às Procuradorias, às delegações extrajudiciais, dele se exige saiba de cor o enciclopédico acervo de toda a normatividade, toda a doutrina e toda a jurisprudência produzida num país de quase cem tribunais. Essa cultura da memorização acompanha a anacrônica educação brasileira, que está em déficit secular. Por isso a ausência de pessoas qualificadas para as exigências de um mercado de trabalho a cada dia mais sofisticado e seletivo. Poucas as vozes que insistem no apuro das aptidões socioemocionais. O profissional de hoje precisa mais de empatia, de capacidade de adaptação e de comunicação, sensibilidade, compaixão pelo próximo, amor àquilo que faz, paixão pelo ofício. Isso não se afere num concurso formal e burocratizado, que de tão previsível, passou a ser dominado pelos famosos “Cursinhos” de preparação, que ensinam até as candidatas a se vestirem, fazem quase psicodrama da prova oral, conseguem reproduzir o curso de bacharelado em alguns meses. E logram a aprovação dos candidatos que se submeteram a esse treino. A boa notícia é que durante a 93ª sessão virtual do CNJ – Conselho Nacional de Justiça, o Ministro Luiz Fux acrescentou disciplinas humanísticas exigíveis às provas para ingresso na Magistratura. Assim, passa a ser requisito dos concursos o Direito Digital, com análise da 4ª Revolução Industrial, transformação digital no Poder Judiciário, tecnologia no contexto jurídico, automação do processo, inteligência artificial e direito, audiências virtuais, Cortes remotas, ciência de dados e jurimetria e Resoluções do CNJ sobre inovações tecnológicas no Judiciário. Uma segunda disciplina é Persecução Penal e novas tecnologias. Crimes virtuais e cibersegurança. Deepweb e darkweb. Provas digitais. Cripto moedas e lavagem de dinheiro. Uma terceira: Noções gerais de contratos inteligentes. Blockchain e algoritmos. A quarta disciplina: LGPD e proteção de dados pessoais. Incluiu-se também o Pragmatismo, análise econômica do direito e economia comportamental. Função judicial e pragmatismo. Antifundacionalismo. Contextualismo. Consequencialismo. Racionalismo e empirismo. Dialética. Utilitarismo. Vem depois Análise econômica do direito. Conceitos fundamentais. Racionalidade econômica. Eficiência processual. Métodos adequados de resolução de conflitos e acesso à Justiça. Demandas frívolas e de valor esperado negativo. Precedentes, estabilidade da jurisprudência e segurança jurídica. Coisa julgada. Foco ainda em economia comportamental, heurística e vieses cognitivos. A percepção de Justiça. Processo cognitivo de tomada de decisão. Também se exigirá Governança Corporativa e Compliance no Brasil. Mecanismos de combate às organizações criminosas e lavagem de dinheiro. Whistlebower. Um passo importante. Mas não é com a inclusão de disciplinas teóricas que se conseguirá atrair talentos para a Magistratura. Há cérebros formidáveis que desempenham funções à luz das tecnologias pós-modernas e que são exemplos exitosos de autodidatismo. Assimilaram o conhecimento novo e imprescindível por força de vontade e empenho. Incluir disciplinas nos currículos é o que fazem os parlamentares, pretendendo com isso aprimorar a educação brasileira. Inviável. Não é com quarenta e cinco ou cinquenta minutos de preleção oral que se aprende um conteúdo complexo e que necessita de pesquisa e prática, muito além da teoria. Enfim, é um bom sinal que o CNJ, que foi idealizado para ser um órgão de planejamento do Judiciário mas se tornou um órgão normativo e excessivamente fiscalizatório. Os juízes comparam a atuação do CNJ às CIPAS – Comissões Internas de Prevenção de Acidentes nas Indústrias, cuja atuação primava por noticiar em cartazes: “11 dias sem acidente”. Eles brincam: “48 horas sem Resolução do CNJ”. Alguns reclamam de que passam boa parcela de seu tempo a informar, preencher planilhas e a se defender. Enfim, o CNJ é órgão do Poder Judiciário e poderia, por exemplo, coibir a volúpia do crescimento vegetativo da Magistratura. Em tempos de crise severa, qual o sentido de se criar mais um Tribunal Regional Federal em Minas? Coisas do Brasil surreal. Publicado no Blog do Fausto Macedo/Opinião/Estadão Em 28.09.2021 voltar |
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