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Acadêmico: Gabriel Chalita A bondade ilumina o mundo, todos os dias, mas há os que desacreditam.
Que bom que você chegou, Maria! Os dias aqui não são dias. Então, não faz tanto tempo que nos despedimos. O tempo aqui não é o tempo. E os espaços são todos. Aqui, Maria, somos nós. E é o que basta. Tudo que não era nosso ficou e você sabe que não faz falta. Antes de você chegar, Maria, você já era daqui. Os sinais da sua paz eram sinais daqui para acalmar os arroubos dos que não compreendem o que fica e o que vai. Sentada na mesa da cozinha, você brincava de limpar o mundo no dobrar das sacolas que traziam a comida. Brincava de disfarçar o tempo organizando a vida. Quando nos conhecemos, você, tão jovem, já emprestava mansidão. Eu era mais agitado. Impressionava você decorando os nomes das ruas. E os seus significados. Você deu significado a mim, Maria. Dormir e acordar com você era uma rua sem fim de felicidade. E vieram os nossos filhos. E uma filha se foi e nos deixou partidos. Eu, em pedaços. Você, inteira. Seus olhos lacrimejavam saudade e acendiam a fé de que os mistérios são véus e não desaparecimentos. Regina, nossa filha, está aqui, Maria. E, também, os outros. Os seus olhos tão abertos prosseguirão enxergando. O corpo descansa, e a alma voa no interior da bondade perfeita. E de nada mais você precisa. E de nada mais preciso eu. A bondade ilumina o mundo, todos os dias, mas há os que desacreditam. E, então, lançam gritos de inumanidades. A bondade prossegue sem retroceder. É água limpa oferecida a quem percebe, a quem se dispõe a se alimentar e a alimentar os seus irmãos de cuidado. Você não descuidou de ninguém, Maria. Seu nome já foi um prenúncio. Do silêncio. Da prontidão. Dos ouvidos atentos ao clamor de uma humanidade melhor. Foram quase cem anos de presença. De um dormir e acordar acompanhada da disposição de não desperdiçar amor. É o que fica, Maria. É só o que fica. Você se lembra dos poderes que eu tive? Das homenagens? Dos cargos? Tudo tão distante daqui! Tudo inventado para distrair. A distração também faz parte. Só que parte em pedaços o que deveria ser inteiro. E é assim que nos olhamos no espelho da vaidade e não enxergamos ninguém. Porque ali ninguém mora. Você dizia, no silêncio, que me amava sem os enfeites. E eu compreendia. E agora, Maria, estamos aqui. Nos completando, novamente, no completo do existir. Nada mais é preciso dizer. Basta sentir. Venha dançar comigo, Maria, a dança que nunca acaba. Ouça a canção do encontro. Toque na imaterial memória do que sempre fomos. Prove da matéria-prima de que fomos feitos. Sabe, Maria, você sempre soube. Você nunca duvidou. Os seus ditos diziam, antes, o que há por aqui. Sem exigir concordâncias. Cada um tem o seu tempo do acreditar. Aqui o tempo é inteiro. Ah, se soubessem por lá o que é a felicidade, as águas do esquecimento fariam perdoar os desacertos e a liberdade seria a compreensão do que fica quando tudo passa. E tudo passa! Que bom que você chegou, Maria! Por aqui, só fica o que permanece. 26 de setembro de 2021. voltar |
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