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SEMANA DE 22 É NOSSA!
Acadêmico: José Renato Nalini
Falta pouco para a celebração da Semana de Arte Moderna de 1922, levada a efeito em fevereiro no Teatro Municipal. Sem bairrismo, essa é uma festa primeiro paulista, para depois ser brasileira.

Semana de 22 é nossa!


Falta pouco para a celebração da Semana de Arte Moderna de 1922, levada a efeito em fevereiro no Teatro Municipal. Sem bairrismo, essa é uma festa primeiro paulista, para depois ser brasileira.

Sei que havia modernistas em outros Estados, principalmente no Rio de Janeiro, a capital federal. Mas não se pode tisnar o brilho desse momento de Piratininga, protagonizado por bandeirantes do século XX.

Nada resulta da iniciativa individual. É óbvio que foi um grupo o responsável pelo manifesto. Mas todos eles precisam ser lembrados, sem exclusão de qualquer.

Hoje, quero recordar a figura de Menotti Del Picchia, o pai do “Juca Mulato”. Nasceu em 20.3.1892 e se formou em 1913 na velha e sempre nova Academia do Largo de São Francisco.

Advogou, foi jornalista, literato de múltiplas facetas, pintor, artista plástico na escultura, fazendeiro em Itapira e tabelião. Prolífico autor de inúmeras obras, quando jovem quase se tornou seminarista. Chegou a esculpir um busto do Cardeal Arcoverde. Em seguida foi encarregado de fazer a imagem do Ressuscitado para a procissão da Semana Santa. Quase deu certo: na pressa, deixou de aguardar o tempo necessário à solidificação do barro e, em pleno percurso, a imagem foi se decompondo.

Diretor do Correio Paulistano, foi ele quem conseguiu do Presidente do Estado a cessão do Teatro Municipal para as apresentações de 22. Fundou em 1924, com Cassiano Ricardo e Plínio Salgado, o “Movimento Verde e Amarelo”, vanguardista para a época, assim como fora a Semana de fevereiro de 22.

Integrante combativo do PRP – o célebre Partido Republicano Paulista, atuou com dinamismo na Revolução de 1932, junto ao Governador Pedro de Toledo. Elegeu-se para a Assembleia Legislativa de São Paulo por dois mandatos e depois chegou à Câmara Federal, onde permaneceu por três legislaturas consecutivas.

Foi membro das duas Academias de Letras: a Brasileira, onde ocupou a Cadeira 28. Presidiu a Associação dos Escritores Brasileiros, seção São Paulo. A sua estória na Academia Paulista de Letras é bem interessante. O ocupante da Cadeira 40, o jundiaiense José Feliciano de Oliveira, radicou-se em Paris, onde permaneceu por quase meio século.

Uma certa diretoria da APL resolveu declarar vaga a sua Cadeira, por ausência renitente a todos os eventos acadêmicos. Elegeu-se, para seu lugar, Menotti Del Picchia. Só que José Feliciano voltou de Paris na década de cinquenta, para voltar a residir em São Paulo e morrer em Jundiaí.

Durante certo período, a Cadeira 40 teve dois imortais. José Feliciano faleceu em 1962. A partir de então, Menotti foi o único titular da derradeira curul da Casa de Cultura por excelência de São Paulo.

Faleceu em 1988, ano da promulgação da Constituição Cidadã e foi velado no átrio da Academia Paulista de Letras, no Largo do Arouche. Sua biblioteca foi entregue a Itapira, cidade em que passou boa parte de sua existência e que adotou como berço afetivo.

O “Juca Mulato” antecedeu a Semana de 22, pois escrito em 1917. É um canto nostálgico de amor não correspondido de um jovem caboclo pela sinhá-moça, filha do patrão. É considerada obra que antecedeu o modernismo brasileiro e sua publicação teve inúmeras edições e múltiplas tiragens.

O herói dessa obra conquistou fervorosos admiradores, que declamaram os versos em saraus por todo o Brasil. Era comum, nas casas brasileiras na primeira metade do século 20, as reuniões de pessoas que recitavam com entusiasmo as poesias dos autores que mais as impressionassem. Assim foi que o verso “Sofre, Juca Mulato, é tua sina…sofre. Fechar ao mal do amor nossa alma adormecida. E, dormir sem sonhar, é viver sem ter vida. Ter, a um sonho de amor, o coração sujeito, é o mesmo que cravar uma faca no peito. Esta vida é um punhal com dois gumes. Não amar, é sofrer, amar é sofrer mais”.

Menotti não pode ser esquecido em 2022, assim como outros bravos paulistas como Washington Luiz, que foi um grande entusiasta da Semana, Rene Thiollier, um dos grandes incentivadores das artes em São Paulo, ao lado de Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Plínio Salgado, que foram os artífices do encontro a que compareceram Villa Lobos, Di Cavalcanti, Anita Malfatti e Tarsila.

Sobre a Semana de 22, Mário de Andrade, vinte anos depois, dizia: “estava delirando quando recitou versos no Municipal e que o movimento modernista foi aristocrático e destruidor”.

Essa aristocracia intelectual sempre caracterizou os modernistas de Piratininga. Sem exclusão de outros brasileiros, dentre os quais Graça Aranha participou ativamente do happening, foram eles os responsáveis por esse choque, a ser celebrado condignamente daqui a poucos meses.

Num momento em que a nacionalidade enfrenta várias crises, é muito bom ter o que comemorar. São Paulo está de braços abertos para os irmãos de todo o Brasil, em fevereiro de 2022.

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Opinião/Estadão
Em 14.09.2021




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