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CÉLIO SALOMÃO DEBES (1926-2021)
Acadêmico: José Renato Nalini
Em momento penumbroso deste Brasil tão complexo, perdemos um valioso referencial para a História de São Paulo. Celio Salomão Debes foi advogado, Procurador do Estado, integrou o corpo jurídico da Companhia Paulista de Estradas de Ferro e atuou como Procurador do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo.

Célio Salomão Debes (1926-2021)

Em momento penumbroso deste Brasil tão complexo, perdemos um valioso referencial para a História de São Paulo. Celio Salomão Debes foi advogado, Procurador do Estado, integrou o corpo jurídico da Companhia Paulista de Estradas de Ferro e atuou como Procurador do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo.

Era profundo conhecedor da História de São Paulo, devotando-se durante vinte e três anos na elaboração da biografia de Washington Luiz Pereira de Souza. Pesquisou, minuciosamente e com raro empenho, toda a vasta correspondência – ativa e passiva – de Washington Luiz. Depois da publicação de alentados três volumes, editados pela Imprensa Oficial do Estado, continuou a ofertar à comunidade de interessados vários outros aspectos da vida desse notável “paulista de Macaé”.

Os três volumes observam a cronologia desse vulto cuja importância para os primeiros anos da conturbada República é muito atual, focando os períodos de 1869 a 1924, de 1925 a 1930 e de 1931 a 1957. Em seguida, Célio Debes escreveu “Non ducor, duco: história de um brasão de armas”, “Washington Luís, sucessor de Mário de Andrade”, “Breve glossário de assuntos” sobre WL, “Os estudos genealógicos de Washington Luís”, “A Justiça Revolucionária criada em 1930”, “O historiador Washington Luís”, “Dois testemunhos sobre Washington Luís”, “Washington Luís e a questão social” , “Os decaídos em 30 e a Revolução Social”, “Gripe Espanhola: consequências e providências”, “Um projeto imigratório integrado”, “O intendente Washington Luís”, “Organização municipal: um exemplo atual do século XIX”, além de inúmeros outros textos, a maior parte deles constando das Revistas da Academia Paulista de Letras.

Apenas no velho continente europeu é que se encontra tamanha devoção a uma personalidade histórica, na procura do exaurimento de todos os aspectos de um brasileiro que foi o último presidente da chamada Primeira República – 1889-1930. Eleito praticamente sem oposição, foi deposto por revolução tramada por antigos aliados, que sempre lhe protestaram apoio. Sua carreira política ainda é um singular modelo de ascensão natural: foi vereador, presidente da Câmara, Prefeito, Deputado Estadual, Secretário de Estado, Governador e Presidente da República.

Célio Debes também escreveu a vida de Campos Salles, “o perfil de um estadista” a quem igualmente admirava. E, eleito em 29.9.1994 para a Cadeira 4 da Academia Paulista de Letras, nela permaneceu durante vinte e sete anos. Foi um prolífico elaborador de textos fidedignos à História paulista de brasileira. Quando a comandar o Departamento Jurídico da extinta Companhia Paulista de Estradas de Ferro, escreveu “A caminho do oeste”, obra premiada e que mostra hoje o erro da adoção das rodovias, com o uso de combustíveis fósseis desnecessários ao transporte limpo dos trens. Foi um dos fundadores da Academia Paulista de História, com a qual contribuiu com outras obras de relevância, como “O Partido Republicano na Propaganda”, “Júlio Prestes e a Primeira República”.

Perfil acadêmico irrepreensível, sempre levou a sério a circunstância de ter sido eleito para integrar um colegiado com propósitos bem definidos: cultivar o idioma, a literatura, a cultura e o sadio convívio entre pares. Tanto que foi um dos primeiros a aderir ao projeto de contemplar em biografias sintéticas, os imortais bandeirantes, na já lançada Coleção APL – IMESP, cujo destino se aguarda mereça o respeito dos responsáveis pela incorporação da Imprensa Oficial à Prodesp.

Escreveu sobre Washington Luís e na véspera de sua morte, ligou-me para dizer que terminara uma segunda biografia: Afonso de Freitas.

Vai-se com Celio Debes uma parte significativa do mais autêntico espírito acadêmico da Casa de cultura por excelência da gente paulista. A coroar toda a erudição e a capacidade para meticulosa pesquisa de campo, ele acrescenta aquela extrema polidez e cordialidade. Afável, bem

humorado, às vezes irônico. Um causeur cuja simpatia mantinha atentos ouvintes ao seu redor. Atento à realidade nacional, preocupava-se com o Brasil, tão distante do que sonhara nas Arcadas e também da utopia alimentada por seus biografados.

Que vele por nós, em companhia de D. Consuelo, que já partira, além da filha, cuja morte o deixou abalado, mas não inibiu a continuidade de seu trabalho profícuo. Inclusive gostava de escrever fatos sobre a história da Academia Paulista de Letras, como o ensaio “Momentos Marcantes da História da APL”, inserta no volume 113 da Revista da Academia. Iniciou o ensaio com atilada observação: “A vida das Associações, qualquer que seja sua natureza, está sujeita a perturbações da harmonia entre seus integrantes, requisito básico para sua sobrevivência”.

Sua elegância, generosidade e amor às letras sirvam de inspiração, para que subsista o espírito acadêmico, a despeito das plúmbeas ameaças que obscurecem o presente momento nacional.

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Opinião/Estadão
Em 08.0.2021



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