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ISSO É O SUPREMO
Acadêmico: José Renato Nalini
Cada vez que ouço dizerem que o Supremo Tribunal Federal está exorbitando, lembro-me daquilo que o juiz Hugo Lafayette Black (1886-1971) teria dito um dia: "Estamos sob uma Constituição, sim. Mas o que é a Constituição? É aquilo que os juízes dizem que ela é!".

Isso é o Supremo

Cada vez que ouço dizerem que o Supremo Tribunal Federal está exorbitando, lembro-me daquilo que o juiz Hugo Lafayette Black (1886-1971) teria dito um dia: "Estamos sob uma Constituição, sim. Mas o que é a Constituição? É aquilo que os juízes dizem que ela é!".

Considerado um dos mais influentes integrantes da Suprema Corte americana, para a qual foi indicado por Roosevelt, nela permaneceu de 1937 até sua morte. Todavia, não foi um criador de jurisprudência nova. Dizia que o Direito Natural era algo tão vago, que permitia aos juízes se alicerçarem nele para julgarem como quisessem.

Não era adepto de liberdade plena da Suprema Corte adaptar o texto fundamental para ajustá-lo às exigências contemporâneas. Chegou a afirmar: "Eu percebo que muitos homens bons e capazes têm eloquentemente falado e escrito sobre o dever deste Tribunal de manter a Constituição em sintonia com os tempos. A ideia é que a Constituição deve ser alterada de tempo em tempo, e que este Tribunal tem com o dever de fazer essas alterações. Rejeito esta filosofia. Os redatores da Constituição sabiam da necessidade de mudanças e disponibilizaram meios para que elas pudessem acontecer. Alterações sugeridas pelos representantes eleitos podem ser enviados para o povo ou para os seus agentes selecionados para a ratificação. Este método de alteração foi bom para os nossos fundadores, e, sendo um pouco antiquado, devo acrescentar que é bom o suficiente para mim".

De qualquer forma, foi fiel cumpridor da sintética lei fundante norte-americana, que resiste desde o século 18 e nunca foi causa suficiente para se considerar os Estados Unidos uma República desprovida de Constituição.

O Supremo Tribunal Federal diz a última palavra no Brasil. E assim deve ser. Quem não se conforma com seus julgamentos precisa convencer o Parlamento a mudar o sistema. Por isso é que existem, recorrentes, propostas de se estabelecer um mandato para os juízes do STF ou de se alterar a forma de sua nomeação.

Já se falou bastante em propiciar uma participação maior da sociedade, como parece ocorrer nos Estados Unidos, de quem copiamos o modelo quando da primeira Constituição republicana. Embora a prerrogativa de indicar o novo Justice recaia na competência do Presidente da República, é comum que a Universidade, a Academia, a mídia, os setores representativos se manifestem. Lançam nomes, apoiam alguns, resistem a outros. O parlamento não é uma casa de homologação, como acontece no Brasil.

Algo que poderia aprimorar a performance do STF seria certo comedimento, ao contrário do excesso de protagonismo televisivo. Embora criada com a melhor das intenções, a TV Justiça parece desservir ao propósito de fazer o Judiciário mais respeitado. Ao se esquecer de que ele é um colegiado, o Supremo se excede num exibicionismo, acaba privilegiando o jogo solo, faz de cada julgador um especialista no excessivo uso das câmeras.

Também não contribui para que o STF seja amado pela sociedade para a qual é preordenado a servir, o uso de linguagem que se afasta da técnica e abusa de expressões que não combinam com a casa de Têmis. Ao visitar a Suprema Corte do Japão fiquei impressionado com o quase anonimato de seus juízes. Deliberam a portas fechadas e seus sintéticos julgamentos são unânimes. Não há voto vencido.

Os pedidos de vista, a falta de prazo para a devolução do processo, o compromisso diuturno com lives, palestras, conferências, manifestações na TV e na mídia, podem fazer de cada julgador um pop star. Mas não é algo que os engrandeça. Sinal evidente de popularidade é o fato de serem tão conhecidos os onze do Olimpo, mais do que eram os craques de futebol, quando este era o esporte preferido dos brasileiros.

Há quem sustente que o Judiciário brasileiro mereceria um recall judicial. A possibilidade do povo cassar a decisão que fosse inteiramente contrária ao ideal de justiça acalentado pelo único titular da soberania, que é o cidadão. Enquanto o Parlamento não se convencer de que algo seria necessário fazer em relação ao órgão de cúpula do sistema Justiça, não há motivo para reclamar. Constituição é aquilo que o STF diz que ela é. Estamos conversados.

Publicado no Jornal de Jundiaí/Opinião
Em 05 09 2021



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