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Acadêmico: José Renato Nalini O estresse hídrico a que o Brasil – e principalmente o sudeste – está submetido não deriva de causas exógenas. É fácil para o cético acusar o La Niña e a falta de chuvas. Mas qual o motivo real para essa concreta ameaça de racionamento e de apagão?
Faltam 8 bilhões de árvores O estresse hídrico a que o Brasil – e principalmente o sudeste – está submetido não deriva de causas exógenas. É fácil para o cético acusar o La Niña e a falta de chuvas. Mas qual o motivo real para essa concreta ameaça de racionamento e de apagão? Nossa insanidade dendroclasta. A sanha de destruir a floresta, de produzir desertos de forma inclemente e, lamentavelmente, a de não considerar a insensatez como destinatária de inafastável punição. O ufanismo reinante – para o qual este é o melhor país do mundo e tudo está sob controle – não alerta a população sobre os custos da utilização de usinas termelétricas a óleo diesel, carvão e gás natural. Fazê-las funcionar em substituição às hidrelétricas representa um custo de treze bilhões de reais. Quem pagará a conta? O cidadão. Campanhas para redução do uso da energia só funcionam em sociedades que atingiram grau civilizatório elevado. Não é o que ocorre no Brasil, com essa educação de baixíssima qualidade. Educação pública mais interessada em rankings avaliatórios, como se a aferição da capacidade mnemônica do aluno fosse critério suficiente para chegar a um parâmetro de sucesso. Um adestramento padronizador que inibe a criatividade, ainda consegue segurar a primeira infância, mas lança para fora das salas de aula a inquietude aflita do adolescente. Ele não suporta aulas prelecionais insossas, quando encontra no mundo web sedução colorida e musical, além de informações mais atualizadas e comunicação direta, alicerçada em ciência e psicologicamente adequada à faixa etária. PUBLICIDADE A segurança energética está íntima e indissoluvelmente vinculada à segurança hídrica. O país que dispunha de 12 de toda a água doce disponível no planeta, sufocou sua galinha de ovos de ouro. Destruiu a floresta Amazônica, incendeia o Pantanal, está com os joelhos no pescoço da Mata Atlântica e os resquícios de verde nas imediações da maior conurbação da América Latina são entregues às chamas. É tão óbvio concluir que preservar nascentes, restaurar matas ciliares, fazer ressurgir os cursos d’água que foram sepultados para servir a sua majestade o automóvel, integram o receituário singelo, perfeitamente factível e ainda possível. Todavia, receituário negligenciado por um Estado que prefere discutir Fundo Partidário, convocar para manifestações belicosas no Dia da Pátria ou incensar a matriz de todos os males, o instituto da reeleição. Os reservatórios dos leitos dos rios e nascentes precisam de urgente reposição de árvores. O déficit de árvores se aproxima dos oito bilhões e, como afirmam Gabriel Barros e Alexandre Uezu, (FSP.6.8.21) é evidente que o problema não é da hostilizada “tribo ambiental”, dos xiitas ecológicos, mas afeta – e muito – a “tribo econômica”. O empresariado, que parece ter acordado para o conceito ESG, precisa hoje enfatizar o “E” de Environmental, de Ambiente, pois o “G” de Governança tem sido bem tratado. É muito menos dispendioso plantar do que sustentar usinas que têm uma extinção no horizonte, pois a descarbonização do planeta é algo que passará a ser compulsório dentro em breve. A não ser que a humanidade continue a preferir o suicídio coletivo e o enceramento da aventura humana sobre esta sofrida e maltratada Terra. O exemplo mencionado pela dupla citada é muito eloquente. Para tornar o sistema Cantareira próximo àquilo que já foi, ou seja, suficiente para fornecer água para quase oito milhões de paulistanos, bastaria o investimento correspondente a setenta e cinco reais por habitante beneficiado com esse abastecimento. Faltam trinta e cinco milhões de árvores para o sistema Cantareira. É o momento de a sociedade inteira despertar e não apenas exigir seriedade do Estado – em todos os seus níveis – mas de atuar, decisivamente, para remendar o estrago gradualmente causado por décadas de omissão, além de ação cruel e deliberada contra o ambiente. A sociedade não compreendeu ainda o perigo que corre. É insuficiente dizer que terá redução nas contas d’água, se vier a economizar. Isso é paliativo. Urge conscientizá-la de que sem água não se vive, embora seja possível viver sem petróleo. Água é fonte de vida, mas também de energia. Integra o desenvolvimento econômico ao irrigar a terra para produção agrícola. Atende ao turismo, permite a criação de peixes para alimentar a população. Um governador ou prefeito amigo do amanhã deveria investir nessa política de replantio. Instituindo concursos, premiando, enaltecendo heróis anônimos que procuram repor árvores arrancadas pela ignorância ou pela cupidez. A mídia precisaria insistir mais na educação informal da população, até para alertá-la de que o risco extremo está mais próximo do que se poderia imaginar. A Academia tem papel relevante, para fornecer elementos seguros de que a gravidade já superou a linha do tolerável. Publicado no Blog do Fausto Macedo/Opinião/Estadão Em 02.09.2021 voltar |
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