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DESDÉM PELO OUTRO
Acadêmico: José Renato Nalini
Americanos apregoam o fervor à Democracia, mas ela funciona só para eles.

Desdém pelo outro

A humanidade parece regredir e de forma tão acelerada e eficaz, de maneira a fornecer razão a quem acredita que o projeto da criatura racional é um fracasso. Há muitos sinais de retrocesso. Porém, o que dizer diante do que ocorre no Afeganistão, onde os Estados Unidos permaneceram durante vinte anos e entregaram o caos para o Talibã?

Paradoxal que há vinte anos, os States tenham justificado o envio de tropas para combater o Talibã. E agora, o Talibã é seu aliado para tentar reprimir o Estado Islâmico. O espetáculo de milhares de pessoas desesperadas querendo deixar sua Pátria é vergonhoso para quem proclama progresso no século 21 e acredita que a situação do mundo melhorou em virtude dos avanços científicos e tecnológicos.

Espetáculo deplorável, propiciado pela nação mais poderosa da Terra. Aquela que se orgulha dos Pais Fundadores, que estabeleceram um regime que nunca mais submeteria a população aos caprichos de reis desalmados.

Os americanos apregoam o seu fervor pela Democracia, mas ela funciona bem só para eles. O que fizeram no Afeganistão e em todas as outras partes do mundo onde foram levar a sua mensagem democrática e ajudar os povos "amigos" a se livrarem do inimigo comum?

Gastaram trilhões de dólares e semearam ódio e destruição. Como foi que torraram essa fortuna? Foi feito algo em favor dos naturais? Qual o balanço desse investimento? Quantas novas escolas foram construídas por eles nos países pelos quais passaram? Vietnã, Iraque, Líbia, Coréia e outras nações que já experimentaram a presença do exército ianque têm a agradecer alguma coisa? Guardam dos americanos a melhor imagem? Consideram os americanos verdadeiramente amigos? Fruem essas populações ainda hoje dos hospitais, das Universidades, dos centros culturais, das moradias, dos templos edificados após a chegada ianque? Ou suas pátrias apenas mostram sinais da calamidade que foi causada pela violência e milhões de viúvas e órfãos choram por seus mortos?

O dinheiro gasto pelos americanos em armamento seria mais do que suficiente para saciar a fome dos miseráveis, para vacinar os desprotegidos, para educar os privados de conhecimento e para desenvolver aqueles quintais que só serviram como laboratório de experiência.

No afã de combater a esquerda, Tio Sam tem se esmerado em semear desgraça e miséria pelo restante do globo. Isso porque não respeita qualquer outro ser humano, a não ser o próprio americano. Não tem conhecimento e não quer conhecer nada além de suas fronteiras. O interesse americano é autocentrado no próprio umbigo. "Você, para mim, é problema exclusivamente seu", poderia ser o mantra que ali se reitera e que tem servido para vitimar indefesos semelhantes.

Não é de hoje que se tem notícia de que a educação americana praticamente desconhece geografia e não toma conhecimento daquilo que não está no seu território. Etnologia é uma ciência inexistente naquela grande nação. Guerra boa é no estrangeiro. Isso explica o elevado investimento na indústria armamentista, que enriquece aqueles que vivem para tirar lucro da indústria que existe para matar os demais. A indústria da morte. Cada vez mais potente, poderosa e hegemônica. A cooptar outras mentes insanas de países periféricos, que carreiam royalties para essa empresa do mal.

Quando será que a criatura tão pretensiosa, tão arrogante, tão egoísta, que se considera a única espécie racional dentre os seres vivos, se compenetrará de que arma é algo que não deveria existir? Instrumento letal, que ceifa o bem mais valioso, aquele pressuposto à fruição de todo e qualquer direito, ou seja, a vida, nunca poderia ser fabricada.

A preocupação do presidente Joe Biden com a sustentabilidade do planeta animou aqueles que enxergam no aquecimento global o maior desafio para os viventes. Mas o súbito entusiasmo cede lugar à melancolia, após constatação do fiasco americano no Afeganistão. Prova manifesta de que os Estados Unidos estão longe de representar o suprassumo da democracia universal.

Tragédia maior, a inexistência de instrumentos hábeis a impedir que catástrofes como essa continuem a ocorrer. Evidência de que os humanos claudicam, pecam e são cada vez mais desumanos.


Publicado no Jornal de Jundiaí
Em 02.09.2021



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