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Acadêmico: José de Souza Martins O movimento que se desenrola entre nós em favor da democracia, que se anima com a perda de lealdades opinativas em favor dos que estão no poder, já se deu conta de que o governo resiste.
O movimento que se desenrola entre nós em favor da democracia, que se anima com a perda de lealdades opinativas em favor dos que estão no poder, já se deu conta de que o governo resiste. Não obstante as decisões equivocadas do governante, de ministros e auxiliares despistados, da enorme incerteza em que vive o país há um ano e meio. Um terço dos consultados nas pesquisas de opinião ainda o favorece, classificando-o como governante ótimo e bom. Reginaldo Prandi, depurando os dados do Datafolha, com critérios adicionais, concluiu que, ainda assim, 15% dos consultados persistem no que é, digo eu, opção antidemocrática. No meu modo de ver, isso não quer dizer que já não haverá declínio nessa preferência. Tudo indica que para esses opinantes a democracia não é uma opção primeira e preferencial e que eles veem no autoritarismo do atual governo uma alternativa de poder que corresponde exatamente ao que pensam e querem. Os erros políticos desgastantes da imagem do governante tem uma eficácia limite na circunstância do governo atual. São várias as evidências de que o que muitos consideram erro, essas minorias relativas consideram acerto. Não por desinformação, mas por opção. Não se trata de conservadorismo, como há os que assim interpretam o distanciamento em relação ao que é sensato e civilizado. A tradição conservadora é qualitativamente outra coisa. Bem diferente da que se manifesta na opinião reacionária, que é a da situação brasileira atual. Trata-se aqui de ignorância associada a poder ou à sensação de poder. Se decompusermos o poder no Brasil pela União, Estados e municípios teremos um elenco amplo de casos de pessoas que chegam ao poder sem estar munidas da formação e informação que lhes possibilite governar com democracia. Acreditam que por terem sido eleitas podem tudo e porque tudo podem tudo sabem, ainda que aquém do que o país historicamente carece. Nisso o que se vê é que os índices de opinião não alcançam nem revelam, necessariamente, os fatores profundos das opções eleitorais nem as de avaliação de governos e governantes. A resposta é inevitavelmente superficial, pois expressa conhecimento provisório e não necessariamente a responsabilidade social e política do cidadão que opina. A nossa é uma cidadania limitada e tosca, o que nas eleições de 2018 levou ao poder pessoas igualmente toscas, que se cercaram de ministros e auxiliares limitados por uma visão de mundo pobre. Não é questão de contra-argumentar e tentar o convencimento dos que são movidos por carência de consciência crítica. Não é raro que corresponda ao que vem à cabeça da pessoa consultada, o que acha sem pensar em face da pergunta súbita. Nesse sentido, a pesquisa de opinião política tende a medir mais a comodidade da omissão e do interesse superficial de quem responde, mais para se livrar da pergunta do que para enfrentá-la criticamente. As respostas não dizem necessariamente para onde se move a compreensão que os brasileiros tem do momento histórico que vivem. Como tendência geral, muitos eleitores, no Brasil, chegam à boca da urna com uma disposição de voto que não é diferente da que tem quando são consultados no momento da pesquisa de opinião. São muito sutis os fatores dos resultados de pesquisas assim. No geral, são resultados tendencialmente acertados, mas baseados no superficial e não no substantivo. Em 2005, Lula achava que não se reelegeria, mas se reelegeu e elegeu, ainda, sua sucessora e a reelegeu. As pesquisas de opinião só no finalmente indicaram que a população o recusava, a ponto de substituir os petistas por qualquer um. E elegeu qualquer um. Um dado certo do comportamento eleitoral do brasileiro é que ele é comodista e conformista. Os fatores de mudança dependem mais do inesperado do que do esperado. Foi o que aconteceu no meio do caminho de Dilma Roussef e abriu a via do poder para políticos despreparados. Aqui, as pesquisas de opinião raramente consideram relevantes os fatores prépolíticos da política no Brasil, aqueles que motivam e causam o desapego pela possibilidade de mudança em direção ao progresso social e ao aprimoramento da democracia política. Esse espírito matuto se disseminou na sociedade inteira. Mesmo as elites brasileiras são matutas quando só aceitam a inovação lucrativa, a do lucro fácil e imediato. É nesse sentido que a sua consciência empresarial é demarcada e limitada por valores e convicções anticapitalistas. Não se dão conta de que a democracia só é vantajosa se for social e socialmente benéfica à emancipação da vontade política do povo e à disseminação da consciência crítica que coloque os governantes permanentemente sob escrutínio e desconfiança. Publicado dia 17 de julho, no Jornal Valor Econômico [Suplemento Eu & Fim de Semana]. voltar |
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