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Acadêmico: Gabriel Chalita "Onde estão as flores? Estão sendo mortas? Espancadas? Há sangue inocente no asfalto. De gente que se conhece pela luta, pela lida, pelo plantio de flores e de gente que só conhecem aqueles que têm o privilégio de morar ao lado, ou junto."
Drummond, há muito, anunciou que uma flor nasceu no asfalto, na rua, que furou o tédio, o nojo, a indiferença, talvez. Como ficar indiferente se as maiores cidades brasileiras se veem mergulhadas na dor? Há asfalto. E há, naturalmente, flor. Onde estão as flores? Estão sendo mortas? Espancadas? Há sangue inocente no asfalto. De gente que se conhece pela luta, pela lida, pelo plantio de flores e de gente que só conhecem aqueles que têm o privilégio de morar ao lado, ou junto. Marielle era uma flor. Mulher guerreira, negra, vinda de lugares visitados pela dor, decidida a lutar pelos seus. Sua voz foi perturbadora. Indiferente, ela não ficaria jamais. Não faz parte dos que se acomodam. Roubaram-lhe o direito de florescer. E o jardim de uma das mais lindas cidades do mundo, o Rio de Janeiro, ficou mais triste. Há outras rosas que se vão todos os dias, antes do dia certo de ir. Vão porque se pisam nelas, vão porque as arrancam sem piedade alguma, vão porque incomodam os que gostam do asfalto sem flor. Em São Paulo, maior cidade do pais, o jardim também sangra. Professores foram espancados pelas autoridades do município. Mulheres e homens que gastam sua vida a cuidar de vidas, a preparar futuros, a semear novos jardins são recebidos como indesejados porque ousam divergir do que pensa o prefeito do município. Espancar um professor? Um, não, vários? Qual a justificativa? Qual a justificativa de matar, de destruir a vida, de segregar, de odiar? Rio de Janeiro e São Paulo cresceram. As duas maiores cidades do Brasil foram sendo construídas pelas mãos generosas de muitos obreiros. O plantio nunca se interrompeu. Crianças nascendo, jovens se conhecendo, trabalhadores indo e vindo, amores se despedindo, vidas encontrando vidas. As paisagens são diferentes. O asfalto no Rio se rende ao espetáculo da natureza. O pôr do sol no Arpoador ou em qualquer canto da cidade que inspirou tantos cantos. O barulho das ondas. As florestas. O jeito carioca de ser. Quem visita se apaixona. O paulistano não para. O mar é de gente. Que consome no mercado municipal ou nos arredores onde mora. Que frequenta a democrática avenida Paulista, que deita em seus parques para namorar. Que anda pelo centro ou curte as trilhas ecoló ;gicas de Parelheiros. A terra da garoa tem seus encantos. Mas o asfalto de uma e de outra está manchado. De sangue e de incompetências. De dor e de injustiças. Do barulho ininterrupto dos ódios e dos preconceitos. Há náusea provocada pela ausência de amor. Mas há uma flor querendo nascer. Há muitas flores querendo nascer. Que nasçam, para que o sangue jorrado dos rostos dos professores, para que a vida arrancada da bela Marielle não tenham sido em vão. Nem o deles nem o dos outros que poderiam se iluminar com os encantos das cidades, mas acabam gastando mais tempo para chorar o choro dos que não conseguem compreender o porquê, os porquês. Por favor, leiam poemas e não desistam de amar as cidades e as pessoas que nelas vivem. Ou isso ou o asfalto, infelizmente, vencerá a flor. * Gabriel Chalita voltar |
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