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MENOS INFORMAÇÃO, MAIS SABEDORIA
Acadêmico: José Renato Nalini
"Será que o excesso de informações nos privou de discernimento? O que fazer com esse tesouro de dados, com diagnósticos elaborados por expertos, com estudos conclusivos, teses arrojadas e dissertações que inundam os acervos das Universidades onde se produz a pós-graduação em sentido estrito em acelerada velocidade"

O século que nos foi dado viver é surpreendente. Penso em meus avós que não viram a explosão comunicacional, não tiveram computador, não imaginaram o smartphone, o tablet, o google, o orkut, o whatsApp, nem puderam compreender o que é startup, o acervo mantido na cloud, a fibra ótica e a banda larga.

A vida era outra. Meus “nonos” italianos eram quase autárquicos. Plantava-se praticamente o que se iria consumir. Vinho, pão e sabão eram feitos em casa. Meus avós brasileiros eram anfitriões, às vezes forçados, de parentes que continuaram a residir na zona rural e que se instalavam sem cerimônia em sua casa acolhedora, a qualquer pretexto. Consultas médicas, partos, temporada de compra ou por mera “fuga” transitória da insipidez da fazenda.

Hoje a criança nasce com chip. A circuitaria neuronal das novas gerações é digital. A nossa é analógica. Desse descompasso nascem muitos estranhamentos. O conhecimento nunca esteve tão disponível e tão acessível como hoje. Qualquer criança curiosa penetra nas maiores universidades e nas mais famosas bibliotecas. Há centenas de milhares de obras contidas no mundo web, à disposição de quem as queira ler.

Entretanto, quanto se regrediu em termos de humanidade. De sensibilidade, de polidez, de bons modos. Onde foi parar a compaixão e a misericórdia? São temas de pronunciamento papal e até definição de um ano emblemático pelo Pontífice. Mas como andamos com a prática? Quem é, na verdade, misericordioso?

Será que o excesso de informações nos privou de discernimento? O que fazer com esse tesouro de dados, com diagnósticos elaborados por expertos, com estudos conclusivos, teses arrojadas e dissertações que inundam os acervos das Universidades onde se produz a pós-graduação em sentido estrito em acelerada velocidade? Qual o uso que disso tudo extraímos para nos tornarmos pessoas melhores, mais ligadas à miséria humana, mais abertas para compreender os dramas do semelhante?

A experiência com a escala dos que ensinam e dos que aprendem me faz meditar continuamente e a perquirir se efetivamente estamos no caminho certo. Educar, em síntese, é tornar as pessoas mais felizes. O preparo com vistas ao amanhã não pode ser cansativo, insosso, desinteressante e opressor. Precisamos tornar o aprendizado sedutor, divertido, desafiador e transformador. Essa a intenção de quem se propôs a modificar o ensino médio, obrigação prioritária dos Estados-membros desta Federação complexa, enquanto que ao município se entrega a educação fundamental e à União a Universidade.

Compreende-se que haja estupefação e estranhamento. Todavia, o tema está aberto à participação de todos os interessados. Haverá condições de oferta de sugestões, de elaboração de um projeto piloto, de implementação gradual das modificações que não se farão ex abrupto. Ao contrário: em São Paulo, já se convencionou reservar o ano letivo de 2017 inteiro para o traçado de um esboço. Todos terão oportunidade de sugerir e de contrapor opções ao projeto original.

O ordenamento jurídico brasileiro, tão utilizado nesta Nação que judicializou a vida e que leva ao Judiciário todos os assuntos e todas as questões, independentemente de sua relevância e da capacidade cidadã de resolver os mais singelos, à luz do princípio da subsidiariedade, tem um princípio basilar: a presunção de boa fé. Por que não acreditar que houve boa intenção em quem propôs a alteração do Ensino Médio? Por que partir justamente do contrário e presumir a má-fé?

Estes dias reclamam prudência, serenidade e juízo. Sensatez e calma, em lugar de ira, exasperação e ofensas. Retiremos do pensamento universal e atemporal a lição de Sêneca: “Quanto a mim, tenho o hábito de passar muito tempo a contemplar a sabedoria: olho-a com a mesma estupefação com a qual, em outros momentos, olho o mundo, esse mundo que tantas vezes me ocorre olhar como se o visse pela primeira vez”.

Sêneca, se estivesse no Brasil de 2016, viria mesmo coisas que só acontecem aqui e que, talvez, não devessem mais acontecer.





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