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FRANCISCO PAI, FRANCISCO FILHO
Acadêmico: Gabriel Chalita
"Enquanto o padre falava, o Francisco pai, sentado, levava o chapéu até o seu peito. E, vez ou outra, passava a mão na cabeça do seu filho, Francisco. O filho sorria, demonstrando gratidão a Deus por ter um pai assim, santo, imaginava eu."

Foi no dia 4 de outubro, dia de São Francisco, que estes dois me surpreenderam.

Antes da missa, houve um acolhimento. Um aspirante (um jovem que se prepara para ser sacerdote franciscano) percorria a Igreja entregando pequenas flores. A Igreja cantava "Irmãos, minhas irmãs, vamos cantar nesta manhã, pois renasceu mais uma vez a criação nas mãos de Deus . Irmã, flor que mal se abriu, fala do amor que não tem fim, água irmã que nos refaz e sai do chão cantando assim...". Abaixei-me para pegar a pequena flor que caiu do pequeno Francisco. Ele estava em uma cadeira de rodas. Sorria muito. Mexia-se como podia. Pouco. A doença roubara-lhe muitos movimentos. Mas a alegria que brotava dos seus olhos e o esforço para algo conseguir cantarolar deixava o pai orgulhoso.

"É meu filho. Meu lindo filho".

"Estou vendo".

"Chama-se Francisco".

"É um lindo nome".

"Também me chamo Francisco. Meus santos pais souberam escolher".

Apenas sorri. O pai tinha as mãos grossas de um trabalhador acostumado às rudezas. Um chapéu ficava sobre o banco. Um pano grande também estava ali. Depois, vi que ele servia para cobrir a cabeça do filho para percorrem as ruas até a casa. "Moramos aqui perto. Francisco gosta muito de missa", justificou. O filho me olhava. Olhos lindos. Sons difíceis de serem ditos. Cabeça de um lado a outro, com esforço. Eu sorria apenas. A missa estava começando. Olhava para o altar e para os Franciscos. A flor caiu novamente. Eu abaixei para pegar. O pai, também. Ele me autorizou a fazer o gesto e eu coloquei novamente na cadeira do seu filho, próxima de suas mãos quase imóveis. Ele olhou para mim. Um olhar de gratidão. Olhamo-nos mais um pouco. Quis dizer al go. Ele, também. Decidimos que não era necessário. Era bom estarmos ali. Durante as músicas, dos seus olhos escorriam lágrimas. Olhos do filho. Olhos do pai.

"Somos muito emotivos".

Eu acenei com a cabeça concordando: "Que bonito!".

"Bonito é ser pai. É ser pai do Francisco".

No ofertório, ele tirou algumas moedas e depositou num cesto que passava. Olhou para mim e explicou: "Gostaria de ter mais para ajudar mais, mas é o que eu posso". O pai falava e o filho olhava. Alguns sons apenas e o sorriso.

A missa terminou. Algumas pessoas vieram conversar comigo. Os dois continuaram ali. Pareciam não ter pressa. O tempo da oração era sagrado. Saímos juntos. Contou-me o pai que o filho nascera vivo graças a um milagre de São Francisco. Com algumas doenças, mas vivo. Com algumas limitações, mas vivo. A mãe já morreu. Há uma outra irmã, mais velha, que vive com eles e os ajuda muito. O pai trabalha de dia. Ela trabalha à noite. É enfermeira. Portanto, sempre há alguém em casa para cuidar de Francisco. Ele disse que experimenta, todos os dias, um prazer único: "Não há preço que pague o sorriso de Francisco, quando abro a porta e entro em casa".

Fiquei imaginando a cena. O cotidiano. O exercício do cuidar. O padre, na missa, havia falado sobre o legado de Francisco de Assis. O santo que nos inspira a viver o amor. "Onde há amor e sabedoria, não há medo nem ignorância".

Enquanto o padre falava, o Francisco pai, sentado, levava o chapéu até o seu peito. E, vez ou outra, passava a mão na cabeça do seu filho, Francisco. O filho sorria, demonstrando gratidão a Deus por ter um pai assim, santo, imaginava eu.

Na saída da Igreja, despedimo-nos. Beijei os dois. Senti tanta paz! Na missa e naquele encontro. Enquanto via aquele homem com o chapéu levando o filho pelas calçadas, fiquei pensando nas minhas lamúrias. Reclamações desnecessárias. A imagem da porta se abrindo e do menino sorrindo sem poder dizer o que gostaria - mas não era necessário, o pai sabia. O sorriso daqueles dois foi um presente do Santo. No seu dia. Para prosseguir. A pequena flor, que algumas vezes caiu, estava nas mãos do pai. Haverá de encontrar algum espaço para deixá-la perfumando o paraíso daqueles dois. Ou melhor, dos três. A irmã chama-se Teresinha. Dia primeiro de outubro, foi dia dela. A santa da delicadeza.



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