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Acadêmico: Gabriel Chalita "Aprendi a chorar contido para não incomodar ainda mais e para estar pronto para ajudá-la."
Tenho 6 anos. Meu nome é Gabriel. Minha mãe dizia que me deu esse nome para que eu fosse um anjo. Minha mãe morreu faz pouco tempo. Quando nasci, ela já estava com câncer. Antes de mim, veio uma irmãzinha que viveu quase nada. Logo depois, minha mãe foi percebendo um caroço no seio. O médico, que talvez não tivesse tido a devida atenção, disse que era por causa do leite que endurecera por causa da morte da minha irmã. Ela aceitou a explicação e prosseguiu. Ficou grávida de mim. Agradeceu a Deus. Eu nasci. Um outro médico logo percebeu que o antigo caroço não era leite endurecido, mas um tumor maligno. Ela teve que tirar o seio. Eu começava a entender a dor, quando o câncer começou, tempos depois, a ocupar-se do seu pulmão. Eu ficava triste com suas crises. Aprendi o que era balão de oxigênio. Aprendi a chorar contido para não incomodar ainda mais e para estar pronto para ajudá-la. Meu pai sempre foi muito nervoso. Agora, piorou. Minha morreu. E no dia do meu aniversário. Um mês depois, meu pai já estava namorando. Fiquei muito triste, mas não pude dizer nada. Tenho 6 anos. Ele diz que nada entendo da vida dos adultos. Que tenho que lhe obedecer. A namorada do meu pai também é nervosa. Fala pouco comigo. Às vezes, grita. Diz que eu não paro quieto. Ela desarrumou toda a casa. Mexeu até nas santas da minha mãe. Até na imagem do Anjo Gabriel. Não sei onde ela colocou. Perguntei e ela gritou alguma coisa que eu não entendi. Meu pai brigou comigo, quando chegou. Disse que eu não podia ficar maltratando a sua namorada. Eu não sei que história ela contou. Mas fui eu que fui maltratado. Fiquei quieto. Ou melhor, queria ter ficado quieto. Mas não aguentei e comecei a chorar. Ele ralhou comigo. Disse que homem não chora. Que estava na hora de eu deixar de ser criança. Tenho 6 anos, repito. Enquanto meu pai falava, ela olhava com olhos de vitoriosa. Fiquei pensando comigo mesmo que quem quer ser vitorioso de verdade não pode mentir. Meu pai gosta de ficar beijando a namorada o tempo todo. Não se incomoda se eu estou por perto. Acho que ele poderia ter esperado um pouco. Talvez minha mãe esteja vendo. Depois ela vai se ocupar de outras coisas lá no céu e aí ele namora como quiser. Ontem à noite, fiquei olhando para o Céu. Estava tão bonito. Fiquei olhando e pensando na minha mãe. Foi quando vi uma estrela muito, mas muito brilhante. Eu não tive dúvidas. Era minha mãe. Ela estava olhando para mim. E lá ela não tem crises, não vomita, não têm dores. Minha mãe é uma estrela. E ela vai me levar para morar com ela. Ela me deu um nome de anjo, mas não me deu asas. Não foi por mal. Esse poder, ela não tinha. Nem o poder de me ver crescer. Ela me beijou muitas vezes e disse que não tinha medo de morrer, só tinha pena de não poder ficar comigo. Não tenho raiva do meu pai. Só fico triste por ele não respeitar a minha dor. Minha avó chama isso de luto. Minha avó diz, também, que as pessoas apaixonadas fazem coisas que não devem. Depois a paixão passa e o que foi feito já foi. Não quero julgar meu pai. Só não gosto de ficar perto dele. Talvez ele também esteja sofrendo pela morte da minha mãe. Talvez. Cada um sofre de um jeito. Hoje, estou mais calmo. Depois de ontem, quando a vi no Céu. Brilhando. Foi o jeito que ela encontrou de sorrir para mim. Ela vem me buscar. Por: Gabriel Chalita (fonte: O Dia e Diário de S. Paulo) | Data: 26/09/2016 voltar |
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