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Acadêmico: José Renato Nalini "Não é preciso pegar em armas. Há muito a ser feito para quem realmente é movido pela vontade de ajudar."
Não é incomum nos considerarmos sapientes. Opinamos sobre todos os assuntos. Temos nossas certezas. Julgamos sem provas, criticamos e condenamos. Elaboramos nossas teorias e acreditamos ter receita para tudo. Se estivesse o mundo sob nossa responsabilidade, ele não estaria neste descalabro. Os outros é que não sabem realizar. São incompetentes. E o que fazemos de concreto para melhorar as coisas? A crítica sem ação é inconsequente. O mundo precisa de engajamento. De pessoas que ajam. Que tenham coragem de atuar para melhorar as coisas. Não é preciso pegar em armas. Há muito a ser feito para quem realmente é movido pela vontade de ajudar. Todos reconhecem que o Brasil é um reino de desigualdades. Convivemos com realidades antagônicas e polarizadas. A mais escandalosa riqueza convivendo ao lado da mais abjeta miséria. O que está sendo feito, em nível individual, para corrigir essa anomalia? A cobrança é para o governo, como se este fosse a máquina de resolver impossibilidades e de realizar milagres. Todos sabem que ele é insuficiente. Estruturas arcaicas, estabilidade, descompromisso com a produtividade, burocracia. São inúmeros os entraves postos no caminho de quem pretende acertar. Isso não impede, ao contrário, deveria incentivar o protagonismo de cada idealista. Mencione-se o exemplo de Wimone Weil (1909-1943), que se engajou, inteiramente, no projeto de solidariedade efetiva em relação aos desafortunados. “Desde a infância, minhas simpatias se voltaram para os agrupamentos que se reclamavam como as camadas desprezadas da hierarquia social”, confidenciou a Georges Bernanos, em carta escrita em 1938. Aprendeu com Émile Chartier, cujo pseudônimo era Alain, e um humanista e fervoroso pacifista que reflexão e ação devem ser inseparáveis. O saber só se torna autêntico por meio da experiência. Simone Weil já detectara que o ensino burguês era uma usina de exclusão e passou a dar aulas de literatura para os condutores de trem, num espírito de universidade popular. Pensava em uma “empresa de instrução mútua”, na qual o instrutor talvez tenha de aprender com aquele que instrui. Enquanto isso, escreveu monografia sobre René Descartes, na qual concluiu: “Os trabalhadores sabem tudo; mas fora do trabalho, eles não sabem que possuem toda a sabedoria”. Percebeu que havia uma odiosa distinção entre o trabalho intelectual e manual e propunha uma cooperação metódica de todos. Embora intelectual e filósofa, quis passar pela experiência do operariado e partilhar da sorte dos trabalhadores. “O homem é feito de tal forma que aquele que esmaga não sente nada, é aquele que é esmagado que sente. Enquanto não nos colocarmos ao lado dos oprimidos para sentir com eles, não podemos nos dar conta”. Existe definição mais completa do que seja o contraditório, princípio jurídico tão sofisticado, mas que não propicia a experiência de estar no lugar do outo, antes de produzir algo que incida na vida concreta desse outro? Escreveu “Reflexões sobre a Barbárie” em 1939, propôs uma nova civilização, fundada sobre a espiritualidade do trabalho, o amor pelo bem público e a igualdade. Amor que hoje inexiste, pois o que é público bem de cada um e de todos é por muito considerado “de ninguém”. Como tal, desprezado, vilipendiado, vandalizado e destruído. Sem consciência de que a reconstrução será feira com dinheiro de todos. De quem destruiu e de quem não contribuiu para a destruição, mas também não se opôs a ela. O mundo está repleto de teóricos, mas poucos os que abraçam uma causa coletiva e a ela dão esforço, protagonismo e sacrifício. Simone Weil em sua paixão pelos vulneráveis, contraiu tuberculose e morreu em 24 de agosto de 1943, aos 34 anos. Sua obra só foi publicada após sua morte. Correio Popular de Campinas| Data: 09/09/2016 voltar |
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