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DOR DE ALMA
Acadêmico: Gabriel Chalita
"Não dói o útero, dói a alma" - foi o que disse a jovem vítima de um estupro coletivo no Rio de Janeiro.

"Não dói o útero, dói a alma" - foi o que disse a jovem vítima de um estupro coletivo no Rio de Janeiro.

Já se falou muito sobre a ação covarde e criminosa. Já se noticiou que o fato não foi isolado. As estatísticas são desanimadoras. A violência contra a mulher ocorre a cada alguns poucos minutos. Estupros, espancamentos, humilhações.

Quero ir um pouco além das estatísticas e tentar jogar alguma luz nas causas que geram a violência. Quem é esse homem ou quem são esses homens que se acham no direito de usar o corpo de uma mulher como se fosse um objeto indigno de dizer "não"?
Se ele tem desejo, ela tem de satisfazê-lo? Quem são esses homens ou até essas mulheres que colocam a culpa no comportamento das mulheres que são violentadas? Discursos como "se ela não saísse de casa, isso não aconteceria" ou "se a roupa dela fosse toda fechada, ela estaria protegida" ou "o homem não se segura mesmo, quando a mulher desperta o desejo dele, ele fica descontrolado". Frases que impressionam pelo preconceito e pela ignorância, pelo machismo e pela ausência da compreensão da convivência humana.

Homens são animais racionais. Animais que têm a possibilidade de escolher. Animais que projetam as consequências das próprias escolhas. Diferentemente de um pássaro que faz sempre o mesmo ninho, o homem projeta casas diferentes. Com estilos diferentes. Diferentemente dos animais que não se seguram quando uma fêmea está no cio, homens compreendem que o desejo deve obedecer ao pensamento e que o pensamento conhece o que vem depois.

A legislação é exaustiva na proteção às vitimas desses crimes. Os homens sabem disso. Mas há razões maiores que devem ser respeitadas. As razões humanas ou morais.
Onde nasce a violência? Há teses e teses sobre o tema com conclusões diversas. Ouso propor uma modesta reflexão.
O hábito nos leva aos costumes de fazer o que é correto ou o que é errado. O hábito da honestidade deve ser celebrado. O hábito da insensibilidade deve ser combatido.
Crianças que usam de crueldade contra os animais, e aprendem isso desde cedo, terão mais facilidade para conviver com a dor alheia. Porque não desenvolvem um elemento essencial nas relações humanas: compaixão. Há aqueles que não sentem compaixão por um pintinho que é esmagado nas mãos de uma criança tida como levada, ou por um fogo colocado no rabo de um gato para que saia em disparada, ou por um passarinho morto por disputas de estilingue. Tudo isso é um sinal de um conduzir errático na matéria da sensibilidade. Dos bichos às pessoas. Viram valentões nas escolas ou nas ruas, muitas vezes para impressionar os pais que aplaudem os filhos que batem porque querem vencedores em casa. Além disso, há os exemplos de violência familiar. De demonstração da superioridade masculina sobre a feminina. E o grupo vai crescendo e querendo mostrar valentia. Tosca covardia de derrotados, pois tiveram uma educação errada, recheada de exemplos errados.

É preciso punir severamente os que estupram, os que violentam, os que matam, os que corrompem. Mas é preciso pensar um pouco além. Ir à fonte que gera tamanha insensibilidade. Dói na alma da adolescente vítima do estupro, dói na alma da sociedade que ainda não conseguiu educar para a sensibilidade, a gentileza, o respeito, a compaixão.

Que essa triste cena nos empreste cores para pintar outros cenários. É possível. E é preciso começar desde cedo. Desde sempre.

Por: Gabriel Chalita (fonte: Diário de S. Paulo) | Data: 05/06/2016.




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