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DISCURSO DE RECEPÇÃO A LEANDRO KARNAL PELA ACADÊMICA MARIA ADELAIDE AMARAL
Acadêmico: Leandro Karnal
Leandro Karnal se apresenta como Historiador, mas é propaganda enganosa. Na verdade é um generalista, um homem do Renascimento, que conhece Arte de todas as eras, estilos e regiões.

RECEPÇÃO A LEANDRO KARNAL

Leandro Karnal dispensa apresentações. Mas como é parte da liturgia desta Casa saudar o novo eleito, coube a mim a subida honra de recepcionar Leandro Karnal na Academia Paulista de Letras.

Assim sendo, vamos sem demora para São Leopoldo onde ele nasceu e nasceram seus pais, - Doutor Renato e dona Jacyr -, orgulhosos descendentes de imigrantes alemães que, a partir de 1824, plantaram suas raízes no Rio Grande do Sul.

A família Karnal sempre foi ultracatólica e fortemente interessada em política. Seu tio-avô foi prefeito em Lajeado e seu pai, em 1960, foi eleito vereador pelo Partido Libertador. Não confundir com o atual PL! Trata-se do Partido Libertador, fundado por Raul Pila, baluarte do Parlamentarismo no Brasil.

Dona Jacyr, por sua vez, descende da família SCHLUSEN, de confissão luterana, o que representou um problema quando ela se enamorou de Renato Karnal. Mas como Paris vale uma Missa e um grande amor também, Jacyr concordou em ser batizada na igreja católica e tudo se resolveu harmoniosamente.

Da feliz união nasceram quatro filhos. Leandro foi o terceiro e o segundo menino do casal. “Éramos uma família de classe média interiorana da década de 1960 e 1970”. Mas era também uma família muito musical e onde se falava o melhor vernáculo. Seu pai professor de português era famoso na região pelo uso escorreito da língua pátria. A ponto de certa vez, um inimigo político, corrigido por ele, chamá-lo de “Rui Barbosa em compota”. Imediatamente, o líder do Partido Libertador mandou o sujeito lamber a compota para se nutrir de suas qualidades. O caso acabou virando crônica no jornal da cidade.

Karnal orgulha-se em dizer que o pai, hoje nome de avenida na cidade natal, além de advogado e professor de português, também lecionava latim, francês e inglês comercial no colégio São José. Foi nessa instituição de freiras franciscanas de origem alemã, que todos os seus filhos estudaram e aprenderam a tocar um instrumento musical. A escolha de Leandro recaiu sobre o piano. Mas ele também tocava órgão e cantava no coral Madrigal.

Excelente aluno, aos 17 anos já o vemos no curso História da UNISINOS (Universidade do Vale do Rio dos Sinos), a universidade jesuítica de São Leopoldo. Meses depois, porém, ele deixaria a faculdade para entrar na Companhia de Jesus. O que, aliás, não foi surpresa para ninguém. Desde os quinze anos Leandro dava aula de catequese e era um diligente coroinha desde sua primeira comunhão.

Tudo levava a crer que o jovem Karnal se tornasse soldado de Cristo, a exemplo de Santo Ignácio de Loyola. Mas durante o noviciado ele foi acometido por uma severa crise de fé que o levaria a abandonar o seminário. A decisão não tinha sido motivada pelo desencanto ou decepção com o catolicismo. Ao contrário: ele adorava a Igreja e seus rituais. O processo foi lento e segundo ele, “muito natural”. “Eu era um bom católico, mas não um bom cristão”.

Para alegria de dona Jacyr, que no fundo de sua alma continuava luterana, o jovem Karnal retornou a São Leopoldo para terminar a faculdade. E, aos 23 anos já era professor de História na Universidade em que tinha estudado. Mas a alegria de sua mãe não duraria muito tempo. No ano seguinte, o irrequieto Karnal deixaria o Rio Grande do Sul para fazer Doutorado na Universidade de São Paulo.

Aqui pra nós: ele saiu da Companhia de Jesus, mas o espírito jesuíta jamais abandonou Leandro Karnal.
Senão vejamos a tese de doutoramento que ele defendeu: O teatro de José de Anchieta e dos franciscanos do México e sua utilização como instrumentos de catequese.
O tema, que demandou pesquisas na Espanha, Cidade do México e cursos em Paris, deu-lhe prestígio e projeção. Logo ele seria convidado a participar de um grupo internacional que pesquisava relíquias religiosas. Incansável, ainda estudou a aparição da Virgem de Guadalupe e a incorporação da cultura indígena ao discurso cristão.

De volta a São Paulo, lecionou na PUC e se tornou professor da UNICAMP na graduação e pós-graduação. Paralelamente, dava cursos e palestras e fez a curadoria de várias exposições, entre elas A Escrita da Memória.

Com metade desse currículo Leandro Karnal poderia concorrer à Academia Francesa. E ainda nem chegamos aos templos de Miamar, que ele conhece como a palma da mão!
Leandro Karnal se apresenta como Historiador, mas é propaganda enganosa. Na verdade é um generalista, um homem do Renascimento, que conhece Arte de todas as eras, estilos e regiões. Estudou a Bíblia, a Torá e o Alcorão. Fala sobre Budismo, Taoísmo, Xintoísmo e religiões que o mundo já esqueceu. Discorre sobre Literatura, Política, Filosofia, é especialista em Shakespeare e toca ao piano todos os dias obras de Bach.

Com tamanha erudição e tantos livros publicados, Karnal poderia ter feito carreira na Universidade. Mas o destino ou o acaso tinham outros planos. Estava ele na UNICAMP, quando trechos de suas palestras começaram a circular na Internet. E foi assim que nasceu o Karnal popstar, com milhões de admiradores dentro e fora das redes sociais.

É uma arte saber falar a uma população tão vasta e um prodígio ser entendido por ela. Leandro Karnal traduz seu conhecimento de forma tão clara, serena e bem-humorada que se pode dizer que nasceu para dividir com milhões pessoas aquilo que sabe. E, nunca o povo brasileiro precisou tanto de palavras inteligentes e argumentos civilizados.

Entre seus livros e vídeos incontáveis, destaco o debate com o Padre Fábio de Melo sobre a existência de Deus. Do começo ao fim, eles mantêm a discussão em um nível superlativo e muito raro de se ver. A agudeza, a tolerância e a generosidade desse diálogo é um daqueles momentos em que o ser humano parece mesmo ter sido criado à semelhança de Deus.

Seja bem-vindo a esta Casa, Leandro Karnal!



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