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DISCURSO DE RECEPÇÃO PELA ACADÊMICA ANNA MARIA MARTINS
Acadêmico: Fábio Lucas
A Academia Paulista de Letras se enriquece ao contar, entre os seus membros, com a inclusão do vosso nome prestigioso. Para essa Casa a vossa presença é uma honra; para quem vos saúda é honra e privilégio ter sido escolhida para tal incumbência.

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Acadêmicos, Autoridades aqui presentes, Senhoras e Senhores, Senhor Fábio Lucas.


Professor, crítico literário, ensaísta, escritor, Doutor em ciências econômicas, vosso currículo profissional vos situa entre os mais destacados intelectuais do país.
A Academia Paulista de Letras se enriquece ao contar, entre os seus membros, com a inclusão do vosso nome prestigioso. Para essa Casa a vossa presença é uma honra; para quem vos saúda é honra e privilégio ter sido escolhida para tal incumbência.
A amizade que nos une e a profunda admiração por vosso trabalho intelectual justificam talvez o privilégio desta escolha.
Vossos ideais e vossa atuação no cenário das letras muitas vezes nos aproximaram. Juntos, trabalhamos em várias ocasiões, como o fazemos agora nesta luta árdua em que vos empenhais, como Presidente da União Brasileira de Escritores, para o fortalecimento da entidade e a aquisição da sede própria.
Vosso trabalho como professor e crítico literário vai da periferia ao cerne, abrangendo o todo da atividade a que vos dedicais.
Nesse final de século em que o exercício da crítica literária é escasso no país, onde raros intelectuais se debruçam sobre a análise das obras publicadas, onde pouquíssimos rodapés de crítica literária sobrevivem nos jornais, vossa dedicação a esse campo das letras é baluarte de profundo significado para o mundo intelectual, sobretudo para nós escritores.
Com um currículo nobre e extenso em atividades desempenhadas, cargos exercidos e trabalhos publicados - percurso profissional de relevância - difícil é para quem vos saúda destacar os marcos mais expressivos de vossa carreira literária. Todos o são. Não é fácil, portanto, senhor Fábio Lucas, no espaço de tempo que nos cabe, resumir a extensão e a importância do lugar que ocupais na vida intelectual do país.

Formação Cultural
Em Esmeraldas, essa cidade que brilha em Minas Gerais, nasceu Fábio Lucas, a 27 de julho de 1931, filho de José Lucas Gomes e Lucrécia Lucete de Paula Silva.
Na cidade de origem fez o curso primário, no Grupo Escolar Visconde de Caeté, concluindo-o em 1940, aos nove anos, com nota máxima. Os cursos ginasial e colegial foram feitos no Instituto Padre Machado em Belo Horizonte.
Na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, em 1953, concluiu o curso de Bacharelado e, no período de 1956 a 1958 fez o Curso de Doutoramento. É Doutor em Direito Público e Ciências Sociais, tendo defendido tese em abril de 1963.
Nesse mesmo ano, em novembro, defendeu tese de Livre-Docência pela Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais. É também doutor em Economia e História das Doutrinas Econômicas.
Em 1966 fez o Curso de Teoria da Literatura pela Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais.
Foi bolsista da Fundação Calouste Gulbekian, em Lisboa, quando realizou pesquisa sobre O Significado da Ficção Portuguesa Contemporânea. Também foi bolsista do Social Science Research Council em Nova Iorque, no período de 1965 a 1966, para estudo de Vanguarda Literária e Ideológica.
São esses, em linhas resumidas, os dados de vossa formação cultural. Passamos agora a nos referir a vosso ingresso no magistério superior, o que ocorreu no segundo semestre de 1957.

Magistério e Cargos Administrativos
Professor e conferencista, a literatura brasileira, conduzida por vossa competência letiva, atravessou as fronteiras do país. Mestre Fábio Lucas lecionou em oito universidades americanas, das quais destacamos a Columbia University, em New York e a University of Wisconsin, em Madison, Wisconsin, onde esteve duas vezes; na segunda vez, por convite especial do Departamento de Espanhol e Português, em 1987, durante um período de seis meses para a realização de seminário e curso sobre o Modernismo Brasileiro.
Em Portugal, lecionou na Universidade do Porto. No Brasil, cinco universidades tiveram o privilégio de contar entre seus mestres com o Professor Fábio Lucas: a Universidade de Minas Gerais, a de Brasília, a Unicamp, a PUC de Campinas e a do Rio Grande do Sul.
Quanto ao que diz respeito a cargos, ocupastes os de relevância, com competência e a dignidade de que vos caracterizam.
Por quatro vezes Presidente da União Brasileira de Escritores, vosso trabalho projetou a entidade em âmbito nacional e além fronteiras. O Congresso de Escritores Brasileiros, em 1985, o maior da história do Brasil, deve sua realização a vosso empenho.
Em 1986, com o escritor e acadêmico Ricardo Ramos, querido amigo falecido há cinco anos, fostes a Moçambique preparar o Congresso de Escritores de Língua Portuguesa a ser realizado em Lisboa. Participastes do segundo Congresso de Escritores, em Língua Portuguesa, em São Paulo, sob a presidência de Henrique Alves. E, sob vossa presidência, realizou-se o primeiro Congresso de Escritores do Mercosul e o Congresso de Escritores do Interior.
Destacamos, também, Sr. Fábio Lucas, vossa brilhante atuação como Diretor do Instituto Nacional do Livro (INL), em Brasília, onde permanecestes durante dois anos no cargo do qual vos desligastes por espontânea vontade.
Foram vários os projetos desenvolvidos em vossa gestão. Alguns executados, outros irrealizados por falta de apoio e verba.
Elevar a distribuição de livros para as bibliotecas, transformando-as em centros culturais; criar uma coletânea de autores brasileiros (cinco livros referentes à cultura de cada Estado e cinco de concurso para poesia, conto e romance); convênio da Imprensa Oficial de cada Estado da União com o Instituto Nacional do Livro (cada Imprensa enviaria de três a cinco funcionários à Brasília para aprender editoração); suspensão de co-edições feitas com cartas marcadas; reunião das Imprensas Universitárias em Campinas; volume iconográfico e curso sobre Manuel Bandeira na Universidade de Brasília nas celebrações do centenário do poeta. Foram estes, Senhor Fábio Lucas, em meio a tantas atividades administrativas inerentes ao cargo, os projetos de vossa criação, entre outros desenvolvidos durante a gestão como Diretor do Instituto Nacional do Livro.

Bibliografia ativa e passiva
Quarenta anos de dedicação às letras, vinte dos quais passados em São Paulo. O amor à palavra escrita revelou-se em tenra idade: aos nove anos obtivestes o prêmio de redação instituído pelo Governo Federal, com o texto As vantagens do Censo; aos doze anos fundastes um pequeno jornal literário estudantil; aos quatorze anos recebestes um prêmio de redação pela revista infantil Era Uma Vez e aos dezesseis, Menção Honrosa no Concurso Permanente de Contos do jornal Folha de Minas, onde vosso trabalho foi publicado.
Desde então, o rumo profissional do jovem estudante foi-se delineando. Economia, ciências sociais, direito e letras eram caminhos que se abriam aos interesses do futuro crítico literário.
Em 1951 o jovem Fábio Lucas fundou a revista literária Vocação, e em 1957, uma revista de vanguarda, Tendência, que reivindicava compromisso social do escritor. Essa publicação, editada em Belo Horizonte por um grupo de estudiosos com concepções semelhantes, propôs uma reformulação da teoria literária no Brasil quanto à defesa do caráter nacional da literatura e cultura geral. Na história das revistas literárias brasileiras, Tendência ocupa lugar de destaque.
A atividade intelectual do professor Fábio Lucas abrange ensaios publicados em revistas nacionais e estrangeiras, prefácios, artigos de crítica e crônicas em periódicos, separatas, colaboração em obras coletivas, entrevistas.
Publicou cerca de vinte livros de crítica literária, uma dezena de trabalhos sobre economia e ciências sociais. Traduziu Introdução ao Método de Paul Valery, de André Maurois; e, mais recentemente, incursionou pela ficção, lançando pela Editora Global o livroA Mais Bela História do Mundo, na coleção Jovens Inteligentes, dirigida pela escritora Edla Vau Steen.
Não nos sendo possível fazer a referência completa de vossa extensa obra literária - maior fora o espaço de tempo de que dispomos, fazê-lo seria render-vos justiça -, destacamos, portanto, as que nos parecem mais significativas.
Compromisso Literário, obra editada em 1964, é complemento da ação do movimento Tendência, e A Face Visível, livro publicado em 1973, contém reminiscências do grupo que fundou a revista.
O Caráter Social da Literatura Brasileira, trabalho publicado em 1970, recebeu o Prêmio Jabuti, entregue ao laureado pelo acadêmico Nogueira Moutinho, confrade cujo falecimento muita saudade nos deixou. Este livro teve, em 1976, uma segunda edição aumentada. O autor aborda aspectos culturais da nossa literatura, a ficção brasileira de fundo social e a ficção brasileira contemporânea.
Fronteiras Imaginárias, obra publicada em 1971, prossegue a linha temática de O Caráter Social da Literatura Brasileira, defende uma literatura intrínseca, estrutural e sociológica, dentro de um ponto de vista relativista quanto ao juízo crítico, orientando-se o exercício da crítica como criação - como consta do texto Fábio Lucas - Um Destaque Especial, de autoria de Avelar Rodrigues. Vanguarda, História e Ideologia da Literatura é trabalho editado em 1985.
As obras Do Barroco ao Moderno - Vozes da Literatura Brasileira e Crepúsculo dos Símbolos - Reflexões sobre o Livro no Brasil foram publicadas em 1989.
Fontes da Literatura Portuguesa e Mineiranças são de 1991; Cartas a Mário de Andrade é trabalho editado em 1993 e Interpretações da Vida Social em 1995.
Mestre Fábio Lucas debruçou-se sobre a obra de prosadores e poetas significativos no panorama da literatura brasileira. Coordenou antologias e interpretou textos de Clarice, Gonzaga, Machado e Murilo Mendes; Fernando Sabino e Autran Dourado; Emílio Moura, Jorge de Lima, Ferreira Goulart, Lygia Fagundes Telles.
No campo da economia e das ciências sociais o Professor Fábio Lucas publicou, entre outras obras, Introdução ao Estado da Repartição da Renda, em 1959; A Redistribuição da Renda, em 1963; Iniciação à Macroeconomia, em 1968 e também nesse ano Intérpretes da Vida Social; em 1976 publicou na Usiminas Revista "O Ferro na História do Brasil e de Minas Gerais".
Em 1996, lançou uma edição crítica, Glaura, de Silva Alvarenga, um ensaio que traz cronologia e notas ao texto. Em edições especiais publicou, em 1995, Presença de Cortázar e, em 1996, um estudo sobre Um gosto de Mulher, de Carlos Méro.
Resenhistas, críticos e scholars manifestaram-se a respeito da obra do Professor Fábio Lucas, analisando a importância da contribuição do mestre às letras, seu desempenho na exegese e divulgação da literatura nacional.
Pinçamos alguns depoimentos:
O escritor e jornalista Romes Barbosa, na coluna "A Semana e os Livros", do O Estado de São Paulo, afirma, em 1963, ser "indubitável que, de longa data, Fábio Lucas deixou de ser um crítico estadual para se tornar federal". E prossegue: "a amplitude dos pontos de vista, a coragem com que defende suas convicções, a predisposição para o debate e a forte consciência de análise o conduziram à primeira fila dos que - seja qual for a corrente - militam na continuação da obra de José Veríssimo e Sílvio Romero" .
O ensaísta norte-americano Raymond Sayers, no estudo Brazilian Literary Criticism Today, publicado na "Luzo - Brazilian Review" da Universidade de Wisconsin, assevera que "importantes críticos cuja análise é estética sem ser basicamente impressionista são Alceu Amoroso Lima, Fábio Lucas, Álvaro Lins e Wilson Martins". Sobre o crítico mineiro, Raymond Sayers acrescenta ser o mais importante de Minas Gerais.
Na opinião de Pessoa de Morais, Fábio Lucas revela-se um pensador, um inquieto, um intelectual ávido de conhecimentos, "de um conhecimento que ilumina a sua visão do fenômeno estético numa dimensão ao mesmo tempo mais ampla e mais detalhada". Ressalta nele a inteligência e sensibilidade, a perspicácia, seriedade e isenção, ingredientes usados na produção de um trabalho altamente meritório, "o que honra a verdadeira e melhor crítica literária brasileira dos nossos dias".

Láureas e Títulos
Reconhecida no país vossa autoridade em assuntos literários, fostes convocado freqüentemente para compor comissões julgadoras de concursos relevantes, como a do "Prêmio Brasília de literatura"; a do "Prêmio Esso de Literatura para Universitários"; a do "Prêmio de Poesia Othon L. Bezerra de Meio", promovido pela Academia Mineira de Letras e a comissão do "Prêmio de Ficção", também promovido por essa Academia.
Recebestes o "Prêmio Jabuti" da Câmara Brasileira do Livro, no setor de Estudos, concedido ao livro O Caráter Social da Literatura, em 1970.
Fostes destacado como a "Personalidade Cultural" de 1981, título concedido pelo "Prêmio Fernando Chinaglia" da União Brasileira de Escritores, seção do Rio de Janeiro.
Da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) recebestes, em 1982, prêmio pela obra Razão e Emoção Literária.
Fostes agraciado com a Medalha da Inconfidência, concedida em 21 de abril de 1983 pelo Governador Tancredo Neves do Estado de Minas Gerais, na ocasião da abertura política.
Em 1992 fostes o "Intelectual do Ano", recebendo o "Prêmio Juca Pato", conferido pela União Brasileira de Escritores (UBE), juntamente com o jornal Folha de S. Paulo.
Membro da Academia Mineira de Letras, recebido pelo poeta mineiro Emílio Moura (autor de Canto da Hora Amarga).
Membro do Conselho Consultivo da Fundação Casa Rui Barbosa.
Membro da Association Internationale des Critiques Littéraires, de Paris.
Título concedido por Sua Excelência Governador Mário Covas, quando Prefeito, a pessoas que contribuíram para a defesa dos direitos humanos. Essa distinção foi outorgada a Fábio Lucas, Dalmo Dalari, Fábio Comparato e outros.
Salientamos estas, Senhor Fábio Lucas, entre as láureas que merecidamente recebestes.
Fábio Lucas foi casado com a professora Maria Luiza Ramos, livre¬docente da Universidade Federal de Minas Gerais. É pai de quatro filhos: Rosana, Glaura, Guilherme e Maria Helena. Em segundas núpcias casou¬se com a poeta pernambucana Lenilde Freitas, que atualmente reside no Recife.
Homem cordial, como diria mestre Sérgio Buarque de Holanda, de fino trato, como se costumava dizer, Fábio Lucas é amigo precioso. Solidário com os companheiros, quando derrubados pelas intempéries da vida, Fábio Lucas preocupa-se não apenas com os que lhe estão próximo. Seu envolvimento é amplo, de fundo social. A ideologia que o caracteriza abrange a militância em prol dos direitos humanos, em prol de uma sociedade mais bem constituída, mais equânime.
Como cidadão, sem radicalismos, posiciona-se com coragem, como sempre o fez, em momentos decisivos para o país. Como intelectual, representa a nata da inteligência brasileira, reflete para o exterior a expressão mais alta da cultura nacional.
Permitimo-nos, portanto, repetir as palavras com que iniciamos este discurso de saudação: a Academia Paulista de Letras se enriquece ao contar, entre seus membros, com a inclusão de vosso nome prestigioso.
Sede bem-vindo a esta Casa, Senhor Fábio Lucas, tomai assento à cadeira N° 27, que agora vos pertence.

Ant



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