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Acadêmico: José Pastore Trata-se, simplesmente, de um problema de equidade que precisa ser resolvido com justiça social.
O polêmico assunto da gratuidade ou do pagamento nas universidades brasileiras voltou à tona com a Proposta de Emenda Constitucional nº 206/2019. Ela estabelece que "as instituições públicas de ensino superior devem cobrar mensalidades, garantindo-se a gratuidade, porém, para os estudantes que não têm recursos suficientes..." É a regra de quem pode paga, quem não pode não paga. Os dados dos últimos anos mostram uma evolução salutar. Em 2004, 55 dos alunos das escolas de ensino superior no Brasil eram filhos dos 20 de famílias mais ricas; hoje, são cerca de 35. Nas escolas privadas, passaram de 68 para 41. Apesar desse avanço, muitas desigualdades perduram. A grande maioria dos estudantes mais pobres frequenta faculdades privadas onde, com grande esforço, pagam mensalidades elevadas — outrora com o auxílio do Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies), que entrou em crise a partir de 2015. Os filhos das famílias mais ricas que frequentam faculdades públicas nada pagam. No caso das faculdades privadas, 62 dos alunos trabalham e estudam. Nas faculdades públicas, a proporção é de apenas 40. O aumento das matrículas dos alunos de menor renda tem alimentado o argumento de que a gratuidade deve ser preservada. Outra alegação é a de que a eventual cobrança de mensalidade dos alunos que podem pagar geraria recursos insignificantes (cerca de 10) para os orçamentos das faculdades públicas. Penso que tais argumentos não invalidam a ideia segundo a qual quem pode pagar deve pagar, pois, com algumas exceções, a conclusão de um curso universitário eleva a renda dos jovens de maneira expressiva pelo resto de suas vidas. Ou seja, eles desfrutam de um valioso benefício privado que é gerado por um ensino público gratuito. Ademais, muitos desses jovens passaram por escolas pagas e caras, tanto no ensino médio quanto no fundamental. Por que parar de pagar quando entram no ensino superior? Em suma, mesmo que sejam apenas 10 os que podem pagar (penso que é muito mais), eles deveriam contribuir para ajudar a financiar as escolas públicas que hoje são mantidas com os impostos recolhidos pela população em geral, inclusive pelos mais pobres que, como se sabe, têm uma carga tributária indireta muito pesada. Trata-se, simplesmente, de um problema de equidade que precisa ser resolvido com justiça social. Aliás, a Constituição Federal usa esse critério no caso da própria Justiça. O artigo 5º, inciso 74, diz que "o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos". Ou seja, no que tange às custas de uma ação judicial e honorários de peritos e advogados, quem pode pagar paga. Quem não pode pagar não paga, desde que comprove a sua situação econômico-financeira. Penso que o mesmo critério deveria valer para quem tem a oportunidade de adquirir conhecimentos de alto valor econômico e pessoal para a sua carreira profissional e para a própria vida e pode pagar. Sei que o assunto é controvertido. Os países variam muito na forma de financiar o ensino superior. Mas uma coisa é certa: ensino público não é sinônimo de ensino gratuito, pois, por trás dessa aparente gratuidade há o trabalho e o esforço de muitos pobres que pagam impostos para que poucos se beneficiem de altos salários e benefícios decorrentes dos conhecimentos obtidos nas escolas públicas de nível superior. Publicado no jornal Correio Braziliense, 03 de junho de 2022. voltar |
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