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JOSÉ MAURO DE VASCONCELOS: DO SUCESSO AO ESQUECIMENTO
Acadêmico: Paulo Nathanael Pereira de Souza
Fomos apresentados pelo saudoso Ciccilo Matarazzo, num daqueles inesquecíveis almoços das terças-feiras, no apartamento do Edifício Nacional, em que residia o fundador das Bienais.

Nesta era do coronavírus e do isolamento social, que nos tornou a todos prisioneiros por tempo indeterminado em nossas próprias casas, o jeito é encontrar passatempos interessantes e proveitosos. No meu caso, o melhor deles se chama leitura. Estou lendo os novos e relendo os clássicos e, nesse afã, me deparei com
as obras de José Mauro de Vasconcelos, um romancista de sucesso nos anos 50 a 70 do século passado. Fomos apresentados pelo saudoso Ciccilo Matarazzo, num
daqueles inesquecíveis almoços das terças- feiras, no apartamento do Edifício Nacional, em que residia o fundador das Bienais. O José Mauro desfrutava de uma
popularidade espetacular entre os intelectuais e tinha no seu ativo de escritor uns 20 ou mais romances lidíssimos, notadamente pelos jovens (muitos deles eram até adotados pelos colégios nas aulas de Português). A imprensa dedicava-lhe elogios sem fim e seu nome ultrapassou as fronteiras brasílicas e circulou por vários países em que teve o privilégio de editar esses livros, como: Alemanha, França, Holanda, Suécia, Noruega, Inglaterra, Japão, Itália, Argentina, Polônia, Áustria, Hungria, Turquia, Bélgica, entre outros. Suas obras em português atingiram no Brasil tiragens
invejáveis, que somavam até trinta edições (o livro, que acabo de reler, e que me inspira esta crônica, “Rosinha, minha canôa”, pertence à 27ª). Os principais títulos de sua biografia, além do que acabei de citar, são os seguintes: “Meu pé de laranja lima”, que até virou filme, “Arara Vermelha”, “Kuryala: Capitão e Carajá”, “Arraia de Fogo”, “Barro Blanco”, “Palácio Japonês", “Chuva Crioula”, “Longe da Terra”,
“Veleiro de Cristal”, “Rua Descalça”, “As confissões de Frei Abóbora", entre outros.
Os temas de José Mauro cultivam um delicioso regionalismo, em torno do qual circulam paisagens e personagens do interior brasileiro, como: o rio Araguaia, os índios, notadamente os da Ilha de Bananal (o autor integrou, sempre que pôde, as excursões dos irmãos Vilasboas), morou nas aldeias dos Carajás, dos Javaes, dos Xavantes, dos Maiurás, dos Txucarramês dos Caiapós, e deles conheceu as línguas, os costumes, as crenças, o heroísmo das grandes solidões e a coragem
guerreira, que lhes assegurava a precária sobrevivência. Num cenário de florestas, e de campos, de fauna e flora feitas de exóticos bichos, de peixes, das águas, e de uma gigantesca sucessão de árvores muitas vezes centenárias, ergue o autor a temática dos povos primitivos, com sua força e fraqueza, suas guerras e cerimônias, sua penosa pobreza e seu futuro incerto e quase que inexistente. Humanismo e naturalismo se entrelaçam nessa farturosa obra literária que fez de José Mauro um precursor dos modernos ecologistas dos modernos ecologistas. O segredo de sua popularidade, como ele mesmo afirma numa entrevista, deve-se à simplicidade no escrever. Ouçamo-lo: “O que atrai o meu público deve ser a minha simplicidade. A minha linguagem regional está numa atitude compreensiva. Os meus personagens
falam uma linguagem regional. O povo é simples como eu. Não tenho nada da aparência de escritor. “É a minha personalidade que está se expressando na literatura, o meu próprio eu”.
Apesar de toda essa fama, foi sempre pobre, e nunca pôde dispensar a ajuda financeira que lhe concedia o Mecenas das artes de São Paulo, Ciccillo
Matarazzo. Vestia-se bem e projetava na sua carioquice inata, uma imagem de homem rico, o que não combinava com sua vida real, toda feita de necessidades,
eis que, sem emprego, nem economias advindas da venda dos livros, socorria-se da generosidade de seu protetor. tanto que várias de suas obras foram a ele
dedicadas, como o “Rosinha”, onde se lê "para o Ciccillão Matarazzo” ou o “Kuryala”, escrito e publicado após o falecimento do velho amigo, a quem quis homenagear.
De repente, ninguém mais falou no José Mauro. Seus livros deixaram de ser editados, os críticos deles se esqueceram, os círculos intelectuais não se deram
conta de seu sumiço, as escolas não mais indicaram textos seus como leituras antológicas dos cursos de Português. Mesmo os que foram seus amigos não mais
tiveram notícias suas. Morrerá ou simplesmente se mudará para os sertões, em protesto contra a extremação do processo de urbanização das cidades? Estaria,
como um personagem Zé Orico, navegando e pescando no Araguaia, ou conversando com bichos e peixes, com árvores frondosas, como o copado landi ou
como o frágil pé de laranja lima? Fato é que morreria em São Paulo, de pneumonia, em 1964.



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