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O SEGURO DE VIDA NA ENCRUZILHADA
Acadêmico: Antonio Penteado Mendonça
"Com o número de mortos se aproximando dos quinhentos mil, o país está vivendo a maior tragédia sanitária dos últimos cem anos, desde quando a gripe espanhola cobrou alto preço da nação. E não há nada que indique que o fim está próximo."

A pandemia do coronavírus corre solta e o quadro pode se estender por muitos meses em função da falta de vacinas.

A CPI no Senado Federal pode apontar falhas e responsáveis, mas não tem o condão de desfazer os erros cometidos desde o início da pandemia até os dias de hoje, que são os grandes responsáveis pela situação delicada que o país atravessa, inclusive sujeito a uma provável terceira onda, pela falta de imunização da população.

Não adianta falar em oitenta milhões de vacinas distribuídas e quinhentos milhões de vacinas adquiridas, quando os números reais, tanto de vacinas à disposição da população, como de pessoas imunizadas, são muito menores. O Brasil não imunizou 10 da população e a razão para isso é, fundamentalmente, a falta de vacinas.

Com o número de mortos se aproximando dos quinhentos mil, o país está vivendo a maior tragédia sanitária dos últimos cem anos, desde quando a gripe espanhola cobrou alto preço da nação. E não há nada que indique que o fim está próximo.

Quando a pandemia chegou no país, o setor de seguros se viu diante de uma situação delicada. Pandemias e epidemias são riscos excluídos das apólices de seguros em geral. A razão é a impossibilidade de se quantificar os valores envolvidos e eles ultrapassarem a capacidade das seguradoras fazerem frente aos sinistros, comprometendo o seu funcionamento e sobrevivência.

Pelo mesmo motivo, os seguros também não cobrem danos decorrentes de radiação de uso pacífico ou militar, guerras, revoluções, ataques terroristas, eventos de origem natural, como furacões, terremotos e outros com a mesma capacidade de destruição, com potencial de causar dano inquantificável.

Quando a pandemia atingiu o Brasil, as operadoras de planos de saúde privados aceitaram assumir os casos de covid19 de seus segurados. É preciso dizer que, para elas, seria extremamente complicado não o fazerem, afinal, outras epidemias, como gripe, dengue, doenças respiratórias, sarampo, etc. são cobertas faz tempo.

Diante da catástrofe social, as seguradoras de vida decidiram que também deveriam aceitar indenizar as mortes decorrentes da covid19. E o fizeram rápida e eficientemente. Com certeza, elas fizeram as contas necessárias para saber do que estavam falando e, ao longo de 2020, elas não fugiram muito do figurino.

Mas em 2021 a situação mudou radicalmente e, em menos de cinco meses, o número de mortos é exponencialmente maior do que o total de 2020. Se imaginarmos que das quinhentas mil vítimas que morreram em função da pandemia 20 tinham seguro de vida e que o capital segurado médio era de cinquenta mil reais, teremos o valor de cinco bilhões de reais em indenizações de seguros de vida a serem pagas em decorrência do coronavírus. E este número deve continuar a subir.

Esta situação está levantando discussões dentro das seguradoras. Afinal, algumas companhias podem ser obrigadas a fazer chamadas de capital para enfrentar o quadro. De acordo com dados informados por executivos do setor, houve um aumento de sinistralidade na carteira de vida da ordem de mais de 12. Como este é o percentual médio, algumas seguradoras foram mais afetadas do que outras, o que impede tratar a situação companhia a companhia.

Entre as propostas apresentadas, duas se destacam. A primeira é suspender o pagamento das indenizações com base na cláusula de exclusão de pandemias e epidemias. Para as apólices em vigor ela é absolutamente inviável. Não há como, agora, um ano e meio depois da chegada do coronavírus ao Brasil, dizer que as indenizações não serão mais pagas porque o resultado das seguradoras piorou. Também não é razoável imaginar que será possível as novas apólices deixarem de pagar as mortes decorrentes da covid19.

Resta a segunda solução, que é fazer o reequilíbrio atuarial das apólices, revendo os custos das seguradoras e, se for o caso, elevar o preço do seguro. Mas é preciso cautela. Será muito difícil os órgãos de defesa do consumidor aceitarem a transferência do custo da ineficiência ou de despesas comerciais para os segurados.


Publicado no dia 24 de maio de 2021, no jornal O Estado de S. Paulo.



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