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Acadêmico: José Goldemberg "Foram as grandes universidades como Oxford (na Inglaterra), Harvard (nos Estados Unidos), Humboldt (na Alemanha) e Paris (na França) que consolidaram o avanço do progresso no mundo todo e foi nelas que se inspiraram brasileiros esclarecidos como Armando de Salles Oliveira que criou a Universidade de São Paulo em 1934."
O Ministro Dias Toffoli, Presidente do Supremo Tribunal Federal fez no evento “O que é o poder?” Realizado em outubro por este jornal uma declaração contundente sobre o papel que as corporações e burocracia ocupam hoje no cenário político do país. Segundo ele. “Nós não temos uma elite nacional. A burocracia ocupou este espaço. Infelizmente, os partidos políticos não fazem projetos de nação. Infelizmente as universidades não fazem projetos de nação”. Há tempos que não se ouve no país um chamado tão importante como este para que as universidades ocupem um papel mais importante no cenário nacional. O que temos visto, pelo contrário são por um lado declarações desarrazoadas e até truculentas de ministros da educação desqualificando as universidades públicas e por outro lado grupos parasindicais dentro delas concentrados na defesa de seus interesses corporativos. Sucede que universidades não são apenas locais em que se aprende uma profissão, mas um espaço em que se tenta entender o mundo que nos cerca tanto do ponto de vista físico como humano e social. Foram, assim que elas surgiram há mais de oitocentos anos começando com a Universidade de Bolonha em 1088 com grupos de estudantes de várias regiões da Europa que se agruparam em torno de grandes professores estudando humanidades e direito civil. Sucede que o imperador Frederico I (Barbossa) do Sacro Império Romano Germanico reconheceu a importância destes estudos sobretudo os que diziam respeito ao direito romano que ele considerava fundamental para legitimar seu poder Frederico I (Barbossa) deu autonomia e proteção à nascente universidade. Ao longo dos séculos inúmeras outras universidades foram criadas em toda a Europa e sua autonomia de modo geral era respeitada como forma de garantir a qualidade dos estudos e pesquisas que realizava. Ao longo dos séculos a procura do conhecimento e uma melhor compreensão da natureza feita por homens como Bacon, Galileo, Newton, Rousseau e muitos outros gerou uma grande efervescência cultural e científica que deu origem ao “iluminismo” que solapou as ideias retrogradas da Igreja da época, que legitimavam monarquias absolutistas e os privilégios da aristocracia. O resultado foi a Revolução Francesa de 1789 que criou o regime republicano que se espalhou pelo mundo todo. Foram as grandes universidades como Oxford (na Inglaterra), Harvard (nos Estados Unidos), Humboldt (na Alemanha) e Paris (na França) que consolidaram o avanço do progresso no mundo todo e foi nelas que se inspiraram brasileiros esclarecidos como Armando de Salles Oliveira que criou a Universidade de São Paulo em 1934. A Universidade do Brasil (hoje a Universidade Federal do Rio de Janeiro) seguiu o mesmo caminho. Estas universidades educaram gerações de profissionais e homens públicos que contribuíram muito para a formulação de políticas públicas no país. Na Universidade de São Paulo o Reitor Miguel Reale na década dos 70 deu à ela uma dimensão tal que teve influência decisiva na organização do sistema universitário brasileiro. A Escola Politécnica antes disso teve enorme papel na consolidação da engenharia nacional. Na área médica o prestigio da Faculdade de Medicina e o trabalho do Professor (e ministro) Adib Jatene e Sergio Arouca da Fiocruz foram essenciais para a criação do SUS (Sistema Único de Saúde) um dos mais abrangentes do mundo. Na área ambiental o Professor Paulo Nogueira Neto USP criou não só a legislação como também a estrutura de todo o sistema de proteção ambiental do país. Na Universidade Federal do Rio de Janeiro, o Professor Alberto Luiz Coimbra criou a COPPE (Coordenadoria de Pós-graduação e Pesquisa de Engenharia) que é a espinha dorsal da pesquisa tecnológica na área de petróleo do país. Em 1987 o Presidente Sarney estimulou na Universidade de São Paulo a discussão sobre o papel dos partidos políticos e a convocação de uma Assembleia Constituinte. Estes são apenas alguns exemplos do muito que já foi feito pelas universidades brasileiras na formulação de políticas públicas para o país em que conhecimento e competência são essenciais. Um exemplo corrente é o papel que um professor como José Pastore teve na formulação da reforma trabalhista em 2018. Contudo não se pode esperar demais das universidades. No regime presidencialista o Governo escolhe as suas prioridade e projetos para a nação e os submete ao Legislativo e mobiliza a sociedade ao mesmo tempo que tenta mobilizar a sociedade para apoiá-los. No passado recente tivemos até governos cujos projetos de nação foram tão mal implementados que nos levaram à maior recessão que o país atravessou. O atual governo não parece ter um projeto propositivo para o país, exceto na área de costumes e seu papel acabou sendo assumido pelo Congresso Nacional numa espécie de “parlamentarismo branco”. Em tese isto deveria reforçar o papel dos partidos políticos o que lamentavelmente ainda não aconteceu. Tem razão portanto o Ministro Toffoli ao lamentar que as universidades não estejam fazendo “projetos de nação” como ocorreu no passado. Parece oportuno tentar recuperar este desempenho estimulando-as a realizar estudos e debates sobre os grandes problemas nacionais. O Presidente Lincoln dos Estados Unidos fez isto há 150 anos atrás (em plena Guerra Civil americana) criando a Academia Nacional de Ciências para “prover recomendações objetivas à nação em matérias relacionadas com ciência e tecnologia”. Esta missão é um pouco restrita para ser copiada, mas um bom começo seria proceder a uma análise objetiva de algumas políticas públicas para o país a começar com políticas educacionais, saúde, energia e infraestrutura áreas nas quais a competência das universidades brasileiras é indiscutível. Publicado no jornal O Estado de S. Paulo, 19 de novembro de 2019. voltar |
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