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PRESIDÊNCIA DO STF, UM DESAFIO DE NOSSOS DIAS
Acadêmico: Tércio Sampaio Ferraz Júnior
"Trata-se de fenômeno ligado à expansão tecnológica, que vem criando uma espécie de marketing de manipulação das decisões judiciais."

Toma posse, como presidente do STF, o ministro Dias Toffoli. E isso ocorre num ambiente de franca politização da Justiça.

Trata-se de fenômeno ligado à expansão tecnológica, que vem criando uma espécie de marketing de manipulação das decisões judiciais.

Esse marketing, orquestrado pelos meios de comunicação e refletido nas redes sociais, provoca uma hipertrofia de exposição midiática da Corte, que passa a gerar consensos e dissensos próprios da política, como são os apoios públicos, a conformação de imagens supostamente partidárias ou de perfis popularizados, como o do juiz liberalizante, punidor, inflexível etc.

Donde o risco de transformação das deliberações e dos acórdãos da Suprema Corte em simples e corriqueiros objetos de consumo.

É inegável que se experimenta atualmente uma transformação no modo de encarar a Constituição, com um perceptível deslizamento do poder constituinte para o poder constituído. Donde o crescimento de um sistema que funciona em sucessões, no qual decisões tomadas se alastram até certo ponto e se interrompem, podendo ser retomadas novamente. O caso da prisão após uma condenação em segunda instância é um bom exemplo.

Tudo isso acaba por se refletir nos julgamentos do próprio STF, cujas decisões, aos olhos do público, parecem girar em torno delas mesmas. Em vez de juízos fundados em uma base centrífuga de validade (a Constituição, a lei), ao olhar popular parecem antes jogadas políticas, que se estabilizam por mútuas e ocasionais vinculações, donde essa sensação de desfalecimento da Constituição ante o poder para interpretá-la.

Ou seja, politizada, a experiência jurisdicional torna-se presa de um jogo de estímulos e respostas que parece exigir mais cálculo do que sabedoria. Segue-se a construção de uma visão meramente pragmática do julgador, que vê transformada sua ação decisória em mera opinião, sujeita a se modificar de acordo com as presumíveis consequências e cuja validade repousa num suposto "politicamente correto".

Daí a percepção popular da Justiça: no lugar das estabilidades surge um mundo que parece sem substância e sem vínculo funcional, sem orientação fixa, sem conclusão e sem definição, apenas conduzido pela mão do acaso, por assim dizer, "the magic hand of chance".

Enfrentar esse quadro é uma das tarefas do novo presidente do STF. Uma tarefa que exige um perfil de estadista, não no sentido político, mas de uma espécie de representação "fiduciária" dos interesses gerais do país, jamais como representação de interesses específicos ou corporativos ou partidários de grupos e facções. Nenhum ministro do Supremo ascende à Corte sem um ato político, a indicação pelo presidente da República e a aprovação pelo Senado. Mas isso não o torna um homem de partido.

Donde a necessidade de entender-lhe a visibilidade: um poder público em público, alguém para quem o ato de julgar se ilumina pela perspectiva do outro, fazendo-nos perceber que se ele é o que pensa, ele nunca pensa apenas o que ele é.

E, por fim, é num momento de ameaça de "revivals" autoritários contra quem não é forte que o novo presidente do Supremo, como um verdadeiro juiz, estará obrigado a entender, de uma forma ativa, o papel do Judiciário. Nessa peculiar circunstância, o ministro Dias Toffoli assume a presidência.

Favorece-lhe uma experiência calcada num dia a dia de embates e superações custosas e adversas. Trata-se, afinal, de problema decisivo entre todos, pois da resposta que para ele for encontrada dependerá o destino de nossa sociedade como sociedade política no sentido original do termo, isto é, sociedade justa.

Matéria publicada na Folha de São Paulo, em 13 Setembro de 2018.

https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2018/09/presidencia-do-stf-um-desafio-de-nossos-dias.shtml



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