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E NÃO DIZEMOS NADA?
Acadêmico: Ignácio de Loyola Brandão
Tudo me preocupa, mas principalmente quando as artes começam a sofrer ataques contínuos, frequentes, em nome da moral.


Tenho medo. Um frio me percorre a espinha e tenho medo. Já senti esse medo antes e temo que aquela atmosfera volte a reinar neste Brasil, cada vez mais intolerante. Tínhamos medo quando ouvíamos a campainha de nossa porta tocar. Ou vozes anônimas agora é pela rede social nos sussurravam, à noite: O próximo será você, por aquele livro, quadro, filme, peça, canção, etc.
O fechamento da exposição de arte no Rio Grande do Sul e a invasão do MAM em São Paulo me assustaram tanto quanto o massacre de Las Vegas nos Estados Unidos. Tenho pavor quando leio que traficantes evangélicos estão atacando religiões afro no Rio de Janeiro. Com esta notícia fiquei perplexo. Quer dizer que traficantes também têm religião? Não ouvi nenhum líder dessa seita repelir a noticia. Nem o prefeito do Rio se manifestou. O prefeito de São Paulo disse: não se pode exagerar. Se a arte não exagerar, quem vai contar o que está se passando? Exagerar? Neste Brasil de malas com 51 milhões sem origem; com o presidente recebendo parlamenta res em sua sala, com os cofres abertos; com ministros várias vezes denunciados e zombando de tudo; com o Cabral ex-governador do Rio acumulando fortuna imensa com seus 5% de oxigênio; com o atual governador Pezão alegando inocência e dizendo: só assinei? O que é exagerar? A palavra perdeu o sentido, o significado.
Tudo me preocupa, mas principalmente quando as artes começam a sofrer ataques contínuos, frequentes, em nome da moral. Que moral? O que virá? O que disse o ministro da cultura sobre os ataques? Alguém leu algo dele? Ou ele defende também a arte pura, sentindo-se ultrajado com a arte degenerada como era definida pelo terceiro reich?
Em um momento assim me volta o poema de um belo poeta e amigo, Eduardo Alves da Costa que tem 81 anos como eu, e resiste.
Como esquecer aquele grito que ele deu em 1968, ano trágico?
Na primeira noite eles se aproximam/ e roubam uma flor/ do nosso jardim. / E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem: /pisam as flores, /matam nosso cão, e não dizemos nada.
Até que um dia, / o mais frágil deles/ entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz e/ conhecendo nosso medo, /arranca-nos a voz da garganta. /E já não podemos dizer nada.
Eduardo, não pedi autorização para reproduzir. Não houve tempo, porém o grito daquela geração, a nossa, que chegou aos 80 anos, volta a ser ouvido.
E outros virão. E não encontrei grito maior do que o seu.



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