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Acadêmico: Synesio Sampaio Goes Filho Artigo publicado na Folha, em 2014, em homenagem aos cinco anos de falecimento de Goffredo Telles Jr.
Faz cinco anos que faleceu um dos mestres mais queridos da Faculdade de Direito da USP. Suas aulas de introdução à ciência do direito no primeiro ano impactavam fortemente os milhares de estudante que teve em mais de seis décadas de magistério. Punha toda a inteligência e toda a vontade em cada preleção e conseguia fazer, como pretendia, "uma obra de arte". Em sua época, havia catedráticos eminentes. Por que será que é sempre o mais lembrado? Não seria necessariamente mais saber. Mais amor? Deve ser. Ninguém amou assim a São Francisco, ninguém tratou com tanto respeito seus alunos. Quem, nessa faculdade ou em outra, escreveu memórias com tanta verdade, com tanta poesia, como ele em "A Folha Dobrada"? Quase mil páginas lindamente redigidas num tom de absoluta sinceridade. Aí descreve a evolução de seu inquieto pensamento: filosofia, direito e, nos últimos tempos, física e biologia. São Paulo e o Brasil vistos por um professor de cidadania. Não fala mal de ninguém, não acerta contas com adversários. Um livro generoso, que revela sua alma. Em filosofia, teve três guias, Spinoza, Kant seu encontro decisivo e Bergson. Na política, San Tiago Dantas, mestre respeitado. "Suas aulas eram simples, de uma clareza meridiana e fascinavam pela beleza do discurso", dizia Goffredo em palavras que poderiam aplicar-se a ele mesmo. Dois professores sobressaem nas memórias: Spencer Vampré e Braz de Sousa Arruda. Homens que dedicaram o melhor da existência à tarefa de ensinar. Que fotobiografia não daria sua vida! O cenário básico seriam as ruas e as praças do velho centro de São Paulo, onde nasceu, viveu e morreu. E quantas imagens: o aristocrático menino que andava a cavalo, de botas e luvas, pelos Campos Elíseos; o promissor deputado de 30 anos, o segundo mais votado do Brasil; o homem de grande beleza física e moral, que punha acima de tudo sua vocação universitária; o boêmio, que conversava com Dorival Caymmi nas noites desvairadas da Pauliceia; sobretudo, o corajoso professor que, ombro a ombro com os moços, era acuado pela polícia no pátio da academia. "Carta aos Brasileiros": momento culminante da vida. Sua leitura, naquele 8 de agosto de 1977, foi um gesto ousado. Para as Arcadas, um documento essencial: criou doutrina e trouxe mais para a esquerda o eixo das posições políticas que a presença de dois professores no Ministério da Justiça havia deslocado para a direita. E para o Brasil? Vários livros a veem como passo decisivo para a democratização. Era homem que não concebia a vida sem trabalhar por uma causa e não podia viver sem amar. No final de suas memórias, em 1997, diz: "Durante todos esses 30 anos referia-se ao seu terceiro casamento, dois arrebatamentos conduziram meus passos: a obsessão pelas formas políticas da liberdade e o amor pela mulher que Deus me deu". Ser humano de grande sensibilidade, seguramente sofreu muito: seus "anos de atribulações", as injustiças da vida acadêmica, uma viuvez e uma separação, a morte de dois filhos... Mas que bela vida! Longa e produtiva, sempre admirado pelos jovens, até o fim dando e recebendo muito amor. SYNESIO SAMPAIO GOES FILHO, 75, advogado, bacharel pela Faculdade de Direito da USP, foi embaixador na Colômbia, Portugal e Bélgica voltar |
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