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NOSSA GUERRA DE TODOS OS DIAS
Acadêmico: Roberto Duailibi
"Quando o jovem se alista jamais imagina que terá de ir para as ruas enfrentar o criminoso comum, aquele que rouba e mata por drogas ou em nome de facções. "

Quando um rapaz recém-saído da puberdade se alista nas Forças Armadas jamais imagina o que irá enfrentar. Ele pensa evidentemente naqueles filmes americanos e europeus do Exército, Marinha e Aeronáutica enaltecendo o dever cívico de servir e pensa em todas aquelas imagens relacionadas a treinamentos, muita ordem unida, educação física, reconhecimento. Também pensa, com tranquilidade, no fato de que o Brasil não vive em guerra, não tem conflitos com seus vizinhos. Mas, como temos visto no noticiário, a realidade, de uns tempos para cá, é bem outra.
Mas, afinal, qual é o papel das Forças Armadas? “A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, NO SEU ARTIGO 142 DEFINE AS FUNÇÕES: Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”.
Um objetivo bastante amplo, o que acaba justificando a utilização mais do que frequente dos militares nas ruas, nas funções que deveriam caber à segurança pública, polícias civil e militar e guarda civil metropolitana. Nunca é demais lembrar que há, além dessas forças, o lado privado, hoje representado milhões de homens, alguns armados, que guardam condomínios, casas, ruas, escoltam cargas e carros blindados.
Quando o jovem se alista jamais imagina que terá de ir para as ruas enfrentar o criminoso comum, aquele que rouba e mata por drogas ou em nome de facções. De repente, o soldado cai no meio de uma disputa por território ou se vê obrigado a, mesmo sem treinamento adequado, exercer o papel de vigilante, de patrulhamento de ruas, morros, becos e vielas.
O Brasil, de verdade, vive uma guerra constante. Não temos conflitos ligados propriamente ao termo defesa da soberania, mas nos vemos todo o tempo num clima de pressão, de guerra. O pior de tudo é que estamos falando de uma guerra específica, a guerra de guerrilha, aquela na qual o inimigo pode adotar estratégias não identificáveis, cabelos, barbas, em visuais absolutamente dissimulados. Podem percorrer terrenos desconhecidos para a tropa oficial e usar a seu favor toda a infraestrutura humana e material local.
Um exemplo disso se deu no ano passado, quando uma patrulha da Guarda Nacional, vinda de outro estado, por puro desconhecimento adentrou numa comunidade carioca e foi cravejada de balas pelos bandidos. Como explicar para a família a morte de um jovem nessas circunstâncias?
O certo é que, de uns tempos para cá os reforços da Guarda Nacional se mostram insuficientes e ao menor sinal de descontrole as Forças Armadas, notadamente o Exército, são acionadas. Basta um simples pedido de um governador ou prefeito. Foi assim na Copa, nas Olimpíadas e tem sido cada vez mais comum e frequente. Desde a lendária subida ao Morro do Alemão, no Rio, anos atrás, à intervenção na greve de policiais no Espirito Santo, recentemente, aos poucos os brasileiros vão se habituando a ver os soldados, seus fuzis, jipes, caminhões e tanques pelas ruas das cidades.
Para quem olha o Brasil de fora para dentro, imagina-se que estamos em guerra, que há uma guerra civil ou uma violência desmedida ou coisa que o valha. Isso certamente afugenta boa parte dos turistas e visitantes dispostos a estudos, cursos, negócios.
Está na hora do País rever todo o seu sistema de segurança, estabelecer uma legislação nova e moderna que discipline o funcionamento de tudo isso, sobre segurança pública, uma política que coíba a corrupção no setor, uma divisão de poderes que regulamente de forma mais equânime os regimes de polícias em todas as instâncias e as tropas privadas. A sensação que o país tem é de total insegurança.
Há algo errado nisso tudo. Outro ponto que chama a atenção é a juventude das tropas das Forças Armadas. A despeito de estarem sob o comando experiente de cabos, sargentos e oficiais de bom senso e muito preparo, há momentos em que se pode exigir de cada um o individualismo da atitude, a reação imediata. A falta de vivência, de preparo até pelo fato de muitos acabarem de ser incorporados às tropas pode produzir estragos históricos à imagem das Forças Armadas e consequências para o resto da vida a muitas pessoas.
Sinto que as coisas seguem sempre sem uma medida de limite. O que era para ser exceção acaba virando regra. O que era para ocorrer uma vez ao ano, passa a duas, três e logo vira constante. É preciso parar e à luz do bom senso definir o que pode e o que não pode, o raio de ação de cada um, o papel funcional de cada tropa.

Publica na Revista DaCultura




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